Reumatologia Pediátrica
O que é a Reumatologia Pediátrica?
A reumatologia pediátrica é uma especialidade médica voltada para o diagnóstico e tratamento de doenças crônicas e inflamatórias que afetam crianças e adolescentes. Essas condições podem comprometer articulações, músculos, pele e outros órgãos, interferindo diretamente no crescimento e no bem-estar físico e emocional da criança.
Entre as doenças mais comuns atendidas por essa especialidade estão:
- Artrite Idiopática Juvenil;
- Sinovite Transitória
- Lúpus Eritematoso Sistêmico Juvenil
- Espondilite Anquilosante Juvenil
- Dermatomiosite Juvenil;
- Esclerodermia
- Púrpura de Henoch-Schönlein / Vasculite por IgA
- Doença de Kawasaki
Essas enfermidades, quando não tratadas adequadamente, podem causar dor crônica, limitação de movimentos, atraso no crescimento e impacto na vida escolar, social e familiar da criança.
Na maioria dos casos, a criança é encaminhada ao especialista após avaliação com o pediatra. No entanto, algumas situações que podem levar a família a procurar o Reumatologista Pediátrico incluem:
- Febre prolongada sem causa aparente.
- Cansaço excessivo.
- Manchas roxas ou avermelhadas na pele (púrpura).
- Dor ou inchaço nas articulações sem motivo claro (Artrite Aguda ou Artrite crônica).
- Suspeita de doenças autoimunes após a avaliação do pediatra.
- Alterações em exames laboratoriais, como FAN, FR, HLA-B27 ou ASLO.
Artrite Idiopática Juvenil (AIJ)
A Artrite Idiopática Juvenil (AIJ) é a forma mais comum de artrite crônica na infância. Trata-se de uma condição inflamatória que afeta uma ou mais articulações, podendo, em alguns casos, envolver outros sintomas sistêmicos al/em das articulações.
Para que o diagnóstico de AIJ seja considerado, alguns critérios precisam ser atendidos:
- Início dos sintomas antes dos 16 anos de idade;
- Duração da inflamação articular por 6 semanas ou mais;
- Ausência de uma causa conhecida para a artrite.
O termo “idiopática” identifica justamente uma condição em que a causa exata da doença ainda não é conhecida. No entanto, acredita-se que fatores genéticos e ambientais possam estar envolvidos no desencadeamento da condição.
O pico de incidência da Artrite Idiopática Juvenil ocorre entre 1 e 3 anos de idade, mas a doença pode surgir em qualquer momento da infância ou adolescência.
A manifestação clinica varia de criança para criança: pode envolver apenas uma articulação (como o joelho ou tornozelo) ou múltiplas articulações, e pode vir acompanhada de febre, erupções cutâneas e outros sintomas.
Espondilite Anquilosante Juvenil
A espondilite anquilosante é uma doença inflamatória crônica de origem autoimune. Ela afeta, principalmente, as enteses — locais onde os ligamentos e cápsulas articulares se fixam aos ossos.
Essa condição pertence ao grupo das espondiloartrites e pode causar dor, rigidez e limitação funcional progressiva.
Cerca de 80% dos pacientes desenvolvem espondilite anquilosante na vida adulta. Nessa faixa etária, o acometimento incial geralmente envolve a coluna lombar, articulações sacroilíacas e quadris.
Nos outros 20% dos casos, a doença tem início ainda na infância ou adolescência. A apresentação inicial nesses casos costuma ser diferente, com dor e inchaço em grandes articulações (joelhos, tornozelos e quadris).
Como característica da doença, a dor ocorre especialmente nas enteses, ou seja, dor nos locais de inserção dos tendões.
A dor na coluna, mais característica nos adultos, tende a surgir mais tardiamente na evolução da doença pediátrica.
Lúpus Infantil
O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) é uma doença autoimune crônica classificada como uma colagenose, ou seja, uma enfermidade que ataca o colágeno — uma proteína essencial para a firmeza, elasticidade e integridade dos tecidos do corpo.
Como o colágeno está presente em praticamente todos os órgãos e estruturas, o lúpus pode comprometer diversos sistemas, como:
- Articulações
- Pele
- Rins
- Cérebro
- Coração
- Pulmões
- Sistema sanguíneo
Entre 10% e 20% dos casos de lúpus são diagnosticados ainda na infância ou adolescência. A manifestação é mais frequente a partir da puberdade, sendo rara antes dos 5 anos.
Os sintomas variam muito de um paciente para outro. Entre os sinais mais comuns estão:
- Cansaço persistente;
- Febre sem causa aparente;
- Lesões na pele (geralmente no rosto e áreas expostas ao sol);
- Queda de cabelo;
- Perda de peso;
- Dor nas articulações;
- Alterações nos rins (nefrite lúpica).
O tratamento do lúpus infantil é individualizado e geralmente envolve:
- Corticoides (como a prednisona)
- Imunossupressores (como a azatioprina ou micofenolato)
- Antimaláricos (como a hidroxicloroquina)
- Medidas de proteção solar
Com o tratamento adequado, a maioria das crianças consegue reduzir os sintomas, manter a qualidade de vida e frequentar escola, brincar e socializar normalmente.
Porém, os efeitos colaterais de medicamentos, como o uso prolongado de corticoides, exigem monitoramento rigoroso e acompanhamento contínuo por uma equipe médica especializada.
O diagnóstico de lúpus na infância impõe mudanças significativas na rotina familiar, como:
- Aumento das idas ao médico
- Ausências escolares
- Momentos de fadiga ou limitação física
Esses desafios, somados às transformações típicas da puberdade, podem impactar emocionalmente o jovem. O suporte psicológico é altamente recomendado para promover adaptação, autoestima e resiliência.
Embora o lúpus em crianças possa apresentar formas mais graves e ativas, com maior risco de danos renais e cardiovasculares, os avanços da medicina têm permitido melhor controle da doença e mais segurança no uso de terapias imunomoduladoras.
Com acompanhamento adequado e suporte multidisciplinar, é possível alcançar bons resultados clínicos e uma vida ativa e produtiva.
Dermatomiosite Juvenil
A Dermatomiosite é uma doença inflamatória autoimune caracterizada pela combinação de fraqueza muscular progressiva e uma erupção cutânea.
Ela acontece em dois grupos etários diferentes:
- Crianças entre 5 e 15 anos;
- Adultos entre 45 e 65 anos.Ela acomete mais as mulheres do que os homens.
Na década de 1950, quando foi descrita, a fatalidade era altíssima, em torno de 50%. O prognóstico melhorou muito nas últimas décadas, especialmente na forma juvenil, graças ao diagnóstico precoce e ao uso adequado de tratamentos imunossupressores.
A maioria das crianças com dermatomiosite juvenil hoje apresenta boa resposta ao tratamento, sendo que:
- 70% a 80% evoluem com melhora significativa da força muscular e redução das lesões de pele.
- 10% a 20% pode desenvolver doença crônica ou recidivante, exigindo tratamento prolongado.
- A mortalidade atualmente está em menos de 5%, especialmente quando o tratamento é iniciado precocemente.
esclerodermia
A esclerodermia é uma doença autoimune que afeta a pele e outros órgãos do corpo. O endurecimento da pele é a principal característica clínica da doença. O nome deriva justamente das palavras “Esclera”, que significa duro e “derma”, que significa pele.
Entretanto, a esclerodermia pode atacar também os pulmões, rins, coração e aparelho digestivo, entre outros órgãos.
A forma de esclerodermia que predomina em crianças, com 90% dos casos, é a esclerodemia localizada. Com tratamento precoce, a maioria dessas crianças tem uma vida normal.
A esclerodermia sistêmica, que causa fibrose em órgãos, é menos comum em crianças. São casos com evolução muito variável, em que o prognóstico depende da gravidade e da resposta individual ao tratamento.
Vasculite por IgA / Púrpura de Henoch-Schönlein (PHS)
A Púrpura de Henoch-Schönlein (PHS) é a vasculite mais comum na infância, caracterizada pela inflamação dos pequenos vasos sanguíneos (vasculite leucocitoclástica).
Vasculite é o termo usado para descrever um grupo de doenças que causam inflamação nas paredes dos vasos sanguíneos, afetando artérias e veias de diferentes calibres.
A doença acomete crianças especialmente entre 3 e 10 anos, sendo mais frequente em meninos. Ela tem maior incidência durante o inverno e a primavera, muitas vezes precedida por infecções virais das vias respiratórias superiores.
Os principais Sintomas da PHS incluem:
- Púrpura palpável: Lesões vermelhas e elevadas na pele, principalmente em pernas, coxas, pés e nádegas. Pode surgir também em braços, couro cabeludo e face.
- Edema subcutâneo: Inchaço em mãos e pés ocorre em até 30% dos casos
- Comprometimento gastrointestinal: a criança pode apresentar dor abdominal, vômitos e sangue nas fezes.
- Comprometimento renal: Pode haver hematúria (sangue na urina) e proteinúria (proteína na urina). Em casos raros, pode evoluir para doença renal crônica.
Na maioria dos casos, os sintomas desaparecem espontaneamente em até 4 semanas, sem deixar sequelas. No entanto:
- Recorrências podem ocorrer em até 1/3 dos pacientes
- Alguns casos podem evoluir para comprometimento renal crônico, exigindo acompanhamento a longo prazo
A PHS é geralmente autolimitada, e o tratamento visa alívio dos sintomas. Analgésicos e anti-inflamatórios são utilizados para controlar dor e inchaço. Em casos mais graves, com comprometimento renal ou digestivo, podem ser indicados corticoides.
Doença de Kawasaki
A Doença de Kawasaki é uma vasculite infantil que afeta principalmente as artérias de médio calibre, com destaque para as artérias coronárias, responsáveis pela irrigação do coração.
Ela ocorre quase exclusivamente em crianças, acometendo principalmente crianças menores de 5 anos. É a segunda vasculite mais comum na infância, atrás apenas da Púrpura de Henoch-Schönlein
A apresentação clínica típica inclui:
- Febre alta e persistente por mais de 5 dias (pode durar até 10 dias)
- Lesões vermelhas na pele (rash cutâneo)
- Conjuntivite bilateral sem secreção
- Lábios, língua e amígdalas vermelhos (língua em “morango” é característica)
- Inchaço e vermelhidão em mãos e pés, podendo haver descamação na fase de recuperação
- Linfadenopatia cervical (gânglio aumentado no pescoço, geralmente unilateral)
O principal risco da Doença de Kawasaki está no comprometimento cardíaco, com aneurismas de artérias coronárias. Esses aneurismas podem levar a trombose e infarto agudo do miocárdio. Isso acontece principalmente quando o diagnóstico é tardio ou o tratamento não é iniciado de forma adequada.