Arritmias cardíacas no Esporte
Arritmias cardíacas no Esporte
O exercício físico pode ser fator desencadeador para diferentes tipos de arritmias, as quais podem apresentar maior ou menor gravidade.
O esforço físico provoca condições como desidratação, hipertermia, desequilíbrios hidroeletrolíticos ou um desequilíbrio entre a oferta e o gasto de oxigênio, favorecendo o aparecimento das arritmias.
Devemos suspeitar da arritmia especialmente na presença de certos tipos de sintomas, incluindo:
- Palpitação (sensação do coração batendo de forma acelerada);
- Dor ou desconforto no peito;
- Desmaios;
- Falta de ar (dispneia).
Em alguns casos, a arritmia pode ser identificada apenas em um exame de rotina, em um atleta assintomático.
Pesquisar e identificar essas arritmias é fundamental, já que algumas formas de arritmias podem ter como primeira manifestação clínica o Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou a morte súbita.
Em outros casos, a arritmia pode ser considerada benigna, sem maiores repercussões para o atleta.
Uma vez identificada a arritmia, a avaliação pelo médico cardiologista, preferencialmente com treinamento em medicina esportiva, ajudará a ditar o tratamento.
Arritmias benignas X malignas
Arritmias cardíacas benignas são aquelas que, em geral, não representam um risco significativo para a saúde.
Elas podem ser assintomáticas ou apresentar sintomas leves, como palpitações ocasionais, batimentos cardíacos acelerados ou sensação de “pausas” no coração.
Exemplos de arritmias benignas incluem a bradicardia sinusal (muito comum em atletas) e as extra-sístoles atriais ou ventriculares isoladas, que são batimentos cardíacos extras e prematuros.
Já as Arritmias cardíacas malignas são aquelas potencialmente perigosas, que podem levar a complicações como desmaios, insuficiência cardíaca, Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou morte súbita.
Exemplos de arritmias malignas incluem as taquicardias ventriculares, Fibrilação Ventricular ou Taquicardia Ventricular Sustentada.
Quais as causas das arritmias no atleta?
Arritmias cardíacas em atletas podem ser causadas por vários fatores, incluindo:
Excesso de exercício físico
A prática de esportes intensos leva a uma série de adaptações no músculo cardíaco e no funcionamento do coração. Eventualmente, alterações fisiológicas no ritmo cardíaco podem acontecer em decorrência dessas alterações.
Doenças Genéticas
Doenças de origem genética, mesmo que presentes desde o nascimento, podem se manifestar apenas na vida adulta.
A Displasia Arritmogênica do Ventrículo Direito (DAVD) é a uma condição grave e que leva ao desenvolvimento de arritmias potencialmente fatais.
Doenças adquiridas
Doenças como a miocardite, a doença de Chagas, a miocardite viral ou a Doença Arterial Coronariana podem levar ao desenvolvimento de diferentes tipos de arritmias, como a Fibrilação Atrial.
O uso de Esteroides anabolizantes pode também provocar lesão no músculo cardíaco e dar origem às arritmias.
Bradicardia sinusal
A bradicardia é uma condição na qual a frequência cardíaca fica abaixo de 60 – na maior parte das vezes, entre 40 e 60.
Essa é uma condição comum em pessoas bem treinadas, que na maior parte das vezes está associada às adaptações fisiológicas no músculo cardíaco e na estrutura do coração decorrentes da atividade física.
Esses atletas compensam a frequência cardíaca reduzida com a entrada de mais sangue no coração e um maior volume sanguíneo ejetado a cada batimento.
Vale aqui considerar que nem todas as bradicardias devem ser consideradas fisiológicas.
Na história clínica, é importante avaliar:
- Presença de sintomas como desmaio ou tonturas;
- Eventual uso de anabolizantes, termogênicos ou outras drogas, que podem provocar uma bradicardia e outras complicações;
- Doenças genéticas herdadas ou doenças cardíacas adquiridas.
Extrassístoles vertriculares
Atletas com batimentos ventriculares prematuros (extrassístoles ventriculares) detectados no eletrocardiograma devem fazer uma investigação mais ampla com o objetivo de excluir doenças cardíacas estruturais.
Exames como o ecocardiograma, hoter de 24 horas ou o teste de esforço podem ser usados para isso. Eventualmente, a Ressonância Magnética poderá ser considerada.
De acordo com as recomendações de 2015 da American Heart Association e do American College of Cardiology:
- Atletas com batimentos ventriculares prematuros na ausência de doença cardíaca estrutural devem ser considerados elegíveis para todos os esportes competitivos. A intensidade de exercício recomendada deve permanecer abaixo do limite para a ocorrência de sintomas relacionados à arritmia, como pré-síncope, tontura ou dispneia.
- Caso seja identificada uma doença cardiovascular de risco, apenas atividades esportivas com baixa demanda cardiovascular são permitidas.
Fibrilação Atrial em atletas
A Fibrilação Atrial (FA) é a arritmia sustentada mais comum na população em geral e também em atletas.
Ela é é mais comumente diagnosticada em homens de meia-idade, saudáveis, que praticam treinamento de resistência há mais de 10 anos.
Apesar de ser considerada uma arritmia benigna, a fibrilação atrial pode ser fatal se não for devidamente diagnosticada e tratada.
O exercício em níveis moderados ajuda na prevenção de Fibrilação Atrial especialmente naqueles pacientes com outros fatores de risco cardiovasculares, como obesidade, colesterol alto, diabetes ou hipertensão arterial.
Por outro lado, a atividade física intensa e por tempo prolongado aumenta o risco de FA em indivíduos aparentemente saudáveis.
Estudos realizados com atletas de elite em modalidades de endurance, como maratona, ciclismo ou esqui cross-country mostram um risco quatro a 15 vezes maior de FA em comparação com a população sedentária em geral.
Estima-se que aproximadamente 40% dos casos de FA isolada, ou seja, naqueles pacientes sem outros problemas cardíacos, tenham a atividade física como fator desencadeante principal.
A FA é mediada por dilatação atrial, aumento da atividade do Sistema Nervoso Parassimpático e possivelmente fibrose atrial.
Sintomas da Fibrilação Atrial no atleta
Grande parte dos atletas com Fibrilação Atrial encontram-se assintomáticos ou com sintomas leves que não limitam a prática de exercício e que não levam o paciente a procurar o médico.
Nos atletas sintomáticos, a palpitação cardíaca (sensação do coração batendo de forma acelerada) é a queixa mais comum. Essa sensação tanto pode aparecer durante a prática do exercício como no repouso. A Fibrilação Atrial é a causa mais comum de palpitação nos atletas.
Um episódio de FA deve durar pelo menos 30 segundos para ser considerado diagnóstico. A partir daí, o coração pode retornar espontaneamente ao ritmo normal ou necessitar de intervenção médica para a sua normalização (com o uso de medicamentos por via oral, endovenosa ou, até mesmo, a cardioversão elétrica).
O desempenho físico geralmente diminui durante os episódios de FA devido à perda da contribuição atrial ao débito cardíaco. Em alguns atletas, a diminuição inexplicável no desempenho físico pode ser o único sintoma clínico da FA induzida por exercício.
Quais os riscos associados à Fibrilação Atrial?
Durante a fibrilação atrial, a eficiência do átrio em bombear o sangue fica prejudicada, facilitando a formação de coágulos.
Estes coágulos podem sair do coração e entupir uma artéria do cérebro, provocando a complicação mais temida da FA, que é o Acidente Vascular Cerebral (AVC).
O risco de AVC é cinco vezes maior em pessoas que têm fibrilação atrial (2).
Diagnóstico
O diagnóstico da fibrilação atrial (FA) é feito por meio de um eletrocardiograma (ECG).
Caso o ECG não identifique a arritmia, pode ser necessário realizar um monitoramento do ritmo cardíaco por um período de tempo mais longo, especialmente através de um monitor Holter, que registra o eletrocardiograma por 24 horas.
O diagnóstico pode também ser feito por meio de um teste ergométrico (teste de esforço).
No paciente já diagnosticado com FA, as causas secundárias da arritmia devem sempre ser pesquisadas, incluindo (mas não limitado) a tireotoxicose, cardiomiopatias ou hipertensão mascarada. Isso deve ser feito mesmo em pacientes com histórico evidente de treinamento esportivo de resistência.
Tratamento
O principal tratamento para atletas com FA é a anticoagulação, que deve ser feita com o objetivo de prevenir a ocorrência de Acidente Vascular Cerebral.
A estratégia de anticoagulação deve seguir as mesmas recomendações da população não atlética.
No caso de pessoas sedentárias, a prática de atividade física regular em moderada intensidade deve ser incentivada por seus efeitos na melhoria
qualidade de vida.
Este procedimento já está muito desenvolvido para o tratamento das arritmias cardíacas, mas só recentemente começou a ser utilizado para tratar a fibrilação atrial.
A ablação cardíaca já está muito desenvolvida para o tratamento das arritmias cardíacas, mas só recentemente começou a ser utilizado para tratar a fibrilação atrial. Ela está evoluindo como uma ferramenta de primeira linha para atletas com arritmia induzida por exercício que desejam permanecer ativos.
A ablação é indicada quando o tratamento com medicamentos não é eficaz ou quando o paciente prefere um tratamento mais definitivo.
Ela pode ser feita por radiofrequência ou crioablação (congelamento) das veias pulmonares. O procedimento consiste em inserir um cateter fino e flexível pelos vasos sanguíneos até o coração, onde são destruídas as vias elétricas anormais do tecido cardíaco.
Atletas sintomáticos submetidos à ablação de FA podem regressar às competições desportivas de alto nível sem restrições.
Cardiopatia Arrimogênica de Ventrículo direito
A Cardiomiopatia Arritmogênica do Ventrículo Direito (CAVD) é uma doença de origem genética caracterizada pela substituição fibrogordurosa patológica do músculo cardíaco (miocárdio). Ela acomete predominantemente o ventrículo direito, embora possa acometer também o ventrículo esquerdo.
As alterações no músculo cardíaco podem levar a taquiarritmias ventriculares e aumentar o risco de morte súbita. A doença é responsável por aproximadamente 5 a 20% dos casos de morte súbita em jovens e atletas
A incidência de CAVD tem variação regional de 1 em 2.000 a 1 em 5.000 (1). Assim como em outras doenças genéticas, a CAVD é transmitida de pais para filhos e pode estar mais ou menos presente em diferentes populações. Na região do Vêneto, na Itália, ela tem sido descrita como a principal causa de morte súbita em atletas.
Sintomas
A CAVD é uma doença de caráter progressiva, ou seja, que se agrava com o tempo independentemente do tratamento. O objetivo do tratamento é evitar as complicações e retardar o avanço da doença.
Os sintomas dependem da fase de evolução da doença. São quatro fases:
- Fase oculta: fase subclínica, em que as anormalidades estruturais se desenvolvem gradativamente, mas sem provocar sintomas.
- Fase arrítmica: o paciente apresenta palpitações, síncope e, geralmente, arritmias ventriculares sintomáticas de origem no ventrículo direito, desencadeadas por esforço fisico. As arritmias podem variar desde uma taquicardia ventricular não sustentada com morfologia tipo bloqueio do ramo esquerdo (BRE), até os episódios de Morte súbita por Fibrilação Ventricular.
- Falência ventricular direita: a progressiva substituição do tecido miocárdico por tecido fibrogorduroso leva a um comprometimento progressivo da função do Ventrículo Direito, podendo resultar em insuficiência cardíaca.
- Falência biventricular: em um estágio avançado da doença, ocorre o envolvimento do septo interventricular ocasionando insuficiência cardíaca congestiva.
A Arritmia com morte súbita pode acontecer em qualquer uma das quatro fases de evolução da doença, podendo inclusive ser a primeira manifestação da doença.
Diagnóstico
O diagnóstico da CAVD pode ser feito a partir da investigação de sintomas característicos, mas pode também ser feito a partir de achados de exames de rotina em pacientes assintomáticos.
O eletrocardiograma costuma apresentar anormalidades na maioria dos pacientes portadores de CAVD, mesmo na fase assintomática da doença.
O ecocardiograma costuma apresentar dificuldades para a visualização das alterações características da doença.
A ressonância Magnética é atualmente a modalidade de imagem de escolha na investigação da CAVD, por possibilitar uma avaliação não invasiva das alterações teciduais que caracterizam essa patologia.
A interpretação da ressonância magnética, no entanto, deve ser feita com cautela. Isso porque muitos dos achados característicos da CAVD podem ser encontrados também como adaptação fisiológica característica do Coração do Atleta, sendo importante realizar o diagnóstico diferencial.
Tratamento
A atividade física intensa acelera a evolução da doença e aumenta o risco de arritmia fatal. Por isso, atletas com CAVD devem ser afastados dessas atividades, independentemente da fase de evolução da doença.
Na fase arrítmica, o uso de medicamentos antiarrítmicos deve ser considerado.
O Cardioversor Desfibrilador Implantável (CDI) deve ser considerado para pacientes com alto risco para morte súbita,
A tentativa de ablação com radiofrequência tem sido considerada nos pacientes não responsivos aos medicamentos. No entanto, as taxas de sucesso são menores do que em outras condições, com altas taxas de recorrência. Assim, eles são habitualmente utilizados de forma coadjuvante. Mesmo após a Ablação, os pacientes com CAVD geralmente precisam implantar CDI, para prevenir morte súbita em caso de recorrência.
Na fase de insuficiência cardíaca, o tratamento deve ser otimizado com medicamentos como os betabloqueadores, inibidores do sistema renina-angiotensina e antagonistas de aldosterona.