Sexualidade na infância
Sexualidade na infância
Apesar de ser extremamente normal e pertencer a uma das fases do desenvolvimento humano, a sexualidade na infância ainda tem “assustado” muitos pais e educadores. Isso pode estar relacionado com a cultura moral e religiosa internalizada que determinados indivíduos podem ter.
Porém, para que possamos construir uma educação sexual mais emancipatória para todos os sujeitos, desenvolvemos este guia com informações e orientações importantes sobre a temática. Acompanhe conosco para saber mais.
Fases da sexualidade na infância
Antes de qualquer coisa, é relevante refletirmos sobre as principais fases da sexualidade na infância. Assim, você poderá visualizar alguns dos motivos pelos quais os seus filhos ou alunos podem estar tomando determinadas atitudes. Vamos adiante.
1. Fase oral
A fase oral perdura por, aproximadamente, os 12 primeiros meses de vida do bebê.
Durante esse período, o bebê passa a experienciar sensações advindas dos cinco sentidos – algo que ele não tinha ao se desenvolver no ventre de sua mãe.
Esses estímulos sensoriais podem provocar uma série de sensações no corpo do bebê, sendo que algumas delas podem ser sexualmente estimulantes.
Porém, é válido frisar aqui que essas sensações sexuais vividas na infância não têm caráter erótico. Isto é, elas têm relação com a sensação de autoprazer, e não com a atração sexual por outros indivíduos ou ao ato sexual em si.
Continuando, essas sensações estão relacionadas, nesta primeira fase, com o prazer oral advindo, especialmente, da amamentação. É muito comum que um bebê menino, por exemplo, demonstre ereção ao amamentar no seio de sua mãe.
Isso porque o contato físico, o prazer oral e todo o enredo vivido naquele momento podem despertar reações fisiológicas de excitação e prazer – que nada tem a ver com erotismo e tampouco é algo “anormal”.
À medida que o tempo passa, essa fase oral começa a ser percebida em outras atitudes do bebê: agora, ele passa a explorar o ambiente com seus lábios e sua boca – por isso que os bebês colocam “tudo na boca” quando estão descobrindo o espaço e os objetos.
2. Fase anal
A fase anal se inicia por volta dos 12 meses de vida do bebê, e pode perdurar até que a criança complete, aproximadamente, 3 anos de idade.
Inicialmente, as trocas de fraldas podem resultar em um estímulo sexual bastante interessante para a criança. A menina pode ter lubrificação vaginal ao ser higienizada com lenços e ao receber a pomada antiassadura, por exemplo.
Já o menino, ao ter o seu órgão genital manipulado pelo cuidador, pode apresentar uma ereção comum e saudável, que também demonstra que as suas sensações táteis estimulam suas reações fisiológicas.
O prazer é sentido de uma forma não erótica, mas sim, com um cunho mais voltado às próprias descobertas do corpo.
Durante esta fase, o desfralde também começa a ser vivido. Por conta disso, a criança passa a sentir um prazer sexual relacionado com o seu próprio ânus e com o controle das esfíncteres.
Esses prazeres se refletem, ainda, na relação com os pais. Afinal, a criança é elogiada e enaltecida quando consegue manter o controle anal e urinário, sentindo-se ainda mais satisfeita com as suas próprias descobertas.
3. Fase fálica
A fase fálica acontece, aproximadamente, entre os 3 e 6 anos de idade.
Por conta do desfralde mais consolidado, nesta fase a criança pode ter um “acesso mais fácil” aos órgãos genitais. Antes, eles estavam “escondidos” por trás de suas firmes fraldas, e agora estão mais “acessíveis”.
As mãozinhas da criança, que agora são mais bem controladas, são utilizadas na exploração do próprio órgão sexual.
Assim, a criança se toca, sente as sensações táteis na região íntima, e assim por diante.
Outro ponto relevante é o de que a criança também começa a internalizar a ideia de macho e fêmea, ao se dar conta de que possui um órgão genital enquanto que o outro pode possuir um órgão diferente.
Os questionamentos sexuais podem começar a surgir, como por exemplo “de onde vêm os bebês”? Trataremos deste questionamento mais adiante, neste artigo.
A criança passa a ter noções básicas do seu corpo como um todo, explorando-se pelo toque e pelas sensações de controlar as próprias necessidades fisiológicas.
Masturbação primária na infância: O que é?
Como vimos logo acima, as fases da sexualidade na infância perpassam diversos acontecimentos e têm relação com muitas descobertas que a criança faz do seu próprio corpo.
Dentre elas, não podemos deixar de citar a chamada “masturbação primária”. Esta surge depois de que a fase fálica começa a ser vivida pela criança. Afinal, é aqui que ela descobre o seu órgão genital e tem um acesso mais fácil a ele.
Por isso, a criança pode começar a se tocar, se esfregar em um brinquedo, e assim por diante. Esse comportamento não tem nada de anormal e deve ser acolhido de uma forma adequada para que a sexualidade do indivíduo não venha a ser reprimida.
Portanto, os pais podem conversar com a criança dizendo que essa atitude não deve acontecer na frente de outras pessoas, mesmo que seja algo bom. Além disso, é possível orientar do fato de que a criança não vê os pais fazendo isso na frente de outras pessoas, o que prova que, apesar de prazeroso, esse comportamento deve acontecer apenas quando estamos sozinhos em nossas casas.
Ao agir dessa forma, o comportamento não é reprimido, mas sim, a criança apenas recebe uma orientação que pode protegê-la de se expor em espaços públicos.
Manter a calma e a tranquilidade nesse tipo de situação é muito importante, assim, será possível transmitir valores à criança, de uma maneira respeitosa e carinhosa.
Lembre-se de que esta masturbação não é erótica, ou seja, a criança não a faz pensando em outras pessoas ou idealizando um ato sexual. Trata-se apenas de uma descoberta das próprias sensações geradas pelo corpo e pelo órgão sexual, portanto, não é algo que deve ser reprimido ou encarado como “doentio”.
Como os pais podem lidar com a sexualidade na infância?
Até aqui, pudemos ter uma visão geral das principais características da sexualidade na infância. Agora, vamos explorar algumas recomendações dadas por especialistas na hora de lidarmos com os assuntos sexuais com os pequenos. Acompanhe e reflita sobre o assunto conosco:
1. Não reprima os comportamentos do seu filho
Um ponto muito importante que os pais devem considerar é o fato de que nós, adultos, não devemos reprimir os comportamentos sexuais das crianças.
Devemos entender como “reprimir” aquele tipo de “briga” que os pais costumam ter com as crianças que começam a apresentar atitudes voltadas ao auto prazer.
Nós não devemos dizer ao nosso filho que ele não deve se tocar ou que isso fará com que “a mão fique cabeluda”, “o órgão genital caia”, ou qualquer outro tipo de história inventada que possa causar medo e coagir os comportamentos naturais do desenvolvimento humano.
Mas sim, devemos estabelecer um diálogo sincero, agradável e que proteja a saúde física e mental dos nossos pequenos.
Por isso, ao invés de dizer “nunca faça isso”, considere dizer “Filho, evite fazer isso na frente de outras pessoas, pois esse comportamento pode expor a sua intimidade. Portanto, só faça isso quando estiver em casa e sozinho, tudo bem? Lembre-se de que não vemos os adultos fazendo isso por aí”.
Justificar o “não” é mais saudável do que apenas proibir a criança. Além do mais, essa proibição, especialmente quando recorrente e excessiva, pode resultar em disfunções sexuais e até problemas de relacionamento sexual na vida adulta. Lembre-se disso.
2. Não puna seu filho por conta dos comportamentos ou dúvidas sexuais
Se porventura você se deparar com o seu filho se tocando de alguma forma, não puna o comportamento dele. Afinal, a punição estaria associada com a repressão que apontamos no tópico acima.
Tente manter a calma e sempre explicar ao seu filho as dúvidas que podem aparecer. Peça para que ele tome um pouquinho de cuidado para que as pessoas não vejam o que ele está fazendo.
Considere aproveitar o momento para também falar de higiene, orientando a criança que se encoste na região íntima apenas com as mãos limpas, para evitar problemas de saúde.
Além disso, converse com o seu filho sobre o fato de que nenhuma outra pessoa tem o direito de tocá-lo daquela forma. Deixe-o saber que apenas ele pode encostar no próprio corpo, e que a região íntima “é proibida” para as outras pessoas – salvo quando os cuidadores dão banho e higienizam a criança depois de ir ao banheiro.
3. Responda de acordo com o que for possível
Não tenha medo de responder às dúvidas do seu filho, tampouco de dizer as nomenclaturas corretas, como “pênis”, “vagina”, etc.
Se você atuar com tranquilidade, respondendo às perguntas de acordo com a idade do seu filho, tudo fluirá mais naturalmente.
Ao invés de tentar fugir das perguntas dizendo que não se fala sobre isso, ou ainda, dando nomes como “piu piu” para o órgão masculino, afinal, isso pode resultar em confusões na cabecinha da criança, tente ser mais sincero e confiante.
Portanto, seja honesto e dê informações aos poucos, que ajudem a criança a entender o próprio corpo e as sensações que ela pode sentir.
Não tenha medo da sinceridade, apenas não exagere na quantidade de conhecimento transmitido. Fique sempre atento ao discernimento e maturidade da criança.
4. Questione de onde a dúvida surgiu
Se a criança chegar até você com uma dúvida sexual, considere questionar de onde veio essa pergunta. Às vezes, a criança pode ter tido contato, “acidentalmente”, com algum material de cunho sexual que despertou a sua curiosidade.
Assim, será possível entender que tipo de informação a criança está acessando, e onde está acessando, sendo viável a construção de um lar mais seguro para os pequenos.
Porém, esse “lar mais seguro” não é o mesmo que um lar que nunca fala sobre sexo e questões sexuais. Mas sim, um lar que não expõe a criança a conteúdos sexuais, como pornografia, por exemplo.
5. Incentive a reflexão sobre os comportamentos sexuais
Ajude a criança a refletir sobre os próprios comportamentos sexuais que ela tem. Por exemplo, se ela se tocar na frente de outra pessoa, ajude-a a refletir sobre isso.
Será que é certo ela fazer isso? As outras pessoas, adultas, especificamente, também fazem? Será que mostrar o corpo é algo bom?
Essas e outras perguntas podem ajudar a fazer o pequeno pensar sobre as próprias atitudes, incentivando as descobertas sexuais que acontecem no privado, em casa, sem outros olhos para visualizarem isso.
6. Mantenha um ambiente acolhedor para a criança se sentir segura
Crie um ambiente acolhedor para que a criança sinta segurança. Se ela se aproxima de você com essas dúvidas, não crie uma “tempestade”. Lembre-se de que a sexualidade na infância acontece, você querendo ou não querendo.
Sendo assim, permita que haja um espaço de diálogo dentro de casa. Sempre deixe claro à criança que ela poderá lhe procurar caso tenha alguma dúvida. Essa atmosfera de escuta pode resultar em mais confiança por parte da criança, e mais segurança por parte de todos, afinal, a criança falará sobre o assunto, os pais poderão tirar dúvidas e, acima de tudo, protegê-la com boas orientações.
7. Use métodos lúdicos de transmissão de conhecimento
Transmitir conhecimento para as crianças é algo que exige carinho, paciência e dedicação. E em se tratando da sexualidade na infância, é possível transmitir conhecimentos valiosos por meio de métodos lúdicos.
É o caso de usar bonecos com órgãos genitais para ensinar a criança; bem como uma boneca que “fica grávida”.
Além disso, livros de histórias infantis que auxiliam na compreensão dessa temática também são relevantes.
Claro que é necessário sempre visualizar a Classificação Indicativa dos materiais que você adquire. Assim, será possível apresentar os brinquedos educativos e as histórias de acordo com a faixa etária do seu filho.
Título
Sem dúvidas, a sexualidade na infância ainda é um tabu na sociedade. Por isso, vemos muitos pais inventando histórias que dizem que os bebês vêm de cegonhas, por exemplo.
Porém, esse tipo de informação pode não ser a mais adequada para os pequenos. O ideal é contar a verdade, com uma linguagem mais simples, lúdica e apropriada.
Por exemplo, ao invés de falar que os bebês surgem da junção de um espermatozóide com um óvulo, considere dizer que o pai tem uma “semente”, e a mãe um “ovo” que, juntos, são capazes de iniciar a formação de um bebê, dentro da barriga da mãe.
Abaixo damos mais detalhes:
1. Mantenha a tranquilidade
Demonstrar desespero, insegurança ou raiva não irá ajudar em nada. Na realidade, pode tornar o momento desconfortável, além de impactar no desenvolvimento emocional da criança.
Por isso, quando se deparar com essa pergunta “inesperada”, tente manter a calma, respire fundo e reflita antes de rebater a pergunta com qualquer resposta que vier à mente.
Precisamos nos munir de conhecimento para conseguir passar as informações de uma maneira segura e satisfatória.
2. Não invente mitos e mentiras
Não invente mentiras para enganar a criança. Seja sincero quando for passar a ela algumas informações.
Isto é, nada de dizer que o bebê surge magicamente, ou que a cegonha o traz pela janela. Afinal, imagine a ansiedade que isso poderia gerar na criança? Ela poderia passar um tempo na janela do quarto, esperando um “irmãozinho”.
Sem contar que a confusão pode piorar ainda mais quando ela percebe a barriga da mamãe ficando grande, a mamãe indo ao hospital e o irmão surgindo dessa forma…
Portanto, tente sempre explicar de uma maneira lúdica, simples, alinhada à faixa etária, mas sem mentir ou inventar lendas para a criança.
3. Com o passar do tempo, complemente as informações
Com o passar do tempo, você poderá complementar as informações. Por exemplo, quando você diz que o pai tem a semente e a mãe um ovinho que forma o bebê na barriga, você está dando informações corretas, com uma linguagem simples, mas que ainda são iniciais.
Mais tarde, à medida que a criança vai criando discernimento e entendendo melhor o mundo, você pode dizer que a semente está presente no pênis do homem, e o ovo dentro da barriga da mãe. Para uma coisa chegar na outra, há um contato natural.
Claro que essa informação deve ser passada às crianças mais velhas, e não de 3 anos. Sempre analise o desenvolvimento do seu filho para ir adicionando informações aos poucos.
E em caso de dúvidas, converse com um psicólogo infantil para que ele possa orientar as suas atitudes frente às descobertas do seu filho ao viver a sexualidade na infância.
Referências
BORTOLOZZI MAIA, A. C.; BAPTISTA SPAZIANI, R. MANIFESTAÇÕES DA SEXUALIDADE INFANTIL: percepção de pais e professoras de crianças de 0 a 6 anosMANIFESTATIONS OF CHILD SEXUALITY: perception of parents and teachers for children from 0 to 6 years. Revista Linhas, Florianópolis, v. 11, n. 01, p. 68 – 84, 2010.
NEDEFF, C. C. CONTRIBUIÇÕES DA SEXOLOGIA SOBRE A SEXUALIDADE INFANTIL NOS DOI PRIMEIROS ANOS DE VIDA: uma revisão bibliográfica SEXOLOGY CONTRIBUTIONS ON CHILD SEXUALITY IN THE FIRST TWO YEARS OF
LIFE: a theoretical revision. Psicologia: Teoria e Prática, 2001, 3(2):83-91.