Depressão na Adolescência
Depressão na adolescência
Até a década de 70, acreditava-se que a depressão na adolescência fosse algo extremamente raro e, por isso, até então foram desenvolvidos poucos estudos sobre a temática.
Porém, com o passar do tempo, essa visão começou a mudar e novas pesquisas começaram a ser desenvolvidas sobre o assunto. Hoje, estima-se que a depressão na adolescência seja mais recorrente do que imaginávamos no passado, com prevalência de cerca de 0,4% a 10%, o que chama a atenção de profissionais da saúde.
Por conta desses fatores, fizemos este guia com uma série de considerações importantes sobre o tema. Nos concentraremos aqui nas especificidades da depressão no público adolescentes. Os aspectos gerais da depressão (válidos também para os adolescentes) são discutidos em um artigo a parte sobre a depressão.
O que é a depressão na adolescência?
A depressão na adolescência, embora tenha sintomas semelhantes aos quadros que acometem adultos, apresenta uma característica diferente: o adolescente não costuma apresentar um humor apenas deprimido ou uma tristeza profunda. Mas sim, os sintomas permeiam mais para o lado da irritabilidade e da impaciência, como se o adolescente estivesse sempre “à flor da pele”.
Sendo assim, a depressão é um quadro clínico que causa desordens no equilíbrio do humor e das emoções do adolescente, podendo ter relação tanto com causas biológicas e químicas (do cérebro), quanto com causas psicológicas e sociais (ambiente e emoções experimentadas no dia a dia).
O humor irritável, ao mesmo tempo em que há uma demonstração de apatia e desinteresse, podem denunciar a presença de um caso de depressão.
Nem toda manifestação de tristeza é patológica
Na adolescência, as explosões de raiva costumam marcar a depressão. Porém, também há a situação de humor deprimido, apatia, falta de prazer e interesse, que demonstram uma posição relacionada com a “tristeza”. Nesses casos, o acompanhamento médico é imprescindível.
No entanto, um cuidado que os pais e os cuidadores devem ter é o de que nem toda manifestação de tristeza, raiva, angústia, medo ou apatia será, de fato, patológica. Afinal, as emoções fazem parte da vida dos seres humanos. Há dias que acordamos mais empolgados, enquanto há dias que sequer temos vontade de cumprir as nossas obrigações.
Sendo assim, é importante reconhecer esse ponto para não “patologizarmos” todas as emoções vividas na adolescência. Isto é, devemos ficar atentos aos reais sintomas de depressão, compreendendo que a tristeza e a insatisfação farão parte da vida de qualquer pessoa, e isso não necessariamente tem relação com um quadro clínico, como depressão.
Obviamente, se as crises emocionais são extremamente frequentes e provocam impactos na rotina e na vida do adolescente, a busca pela investigação profissional é importante. Porém, isso não quer dizer que quando o seu filho se sentir frustrado ou irritado é apenas porque ele tem depressão. Pense nisso.
Quais os sintomas da depressão na adolescência?
Para que possamos fazer uma investigação mais profunda e não corrermos o risco de “patologizar” todas as emoções vividas na adolescência, trouxemos algumas clarificações quanto aos sintomas de depressão na adolescência:
1. Humor deprimido e/ou irritável na maior parte do dia
O humor pode ser deprimido e choroso, bem como pode ser bastante irritável. Isto é, há adolescentes que podem manifestar um humor mais deprimido, como se estivesse constantemente triste e/ou desanimado, mas a prevalência maior é um humor mais irritável, no qual o adolescente costuma ter “explosões de raiva” e irritabilidade.
Essas explosões e características do humor são percebidas na maior parte do dia, independente da atividade na qual o sujeito esteja envolvido.
2. Fadiga ou perda de energia
O adolescente pode sentir uma forte fadiga ou falta de energia mesmo quando não faz ou fez nenhum esforço físico. É o caso de sentir extremo cansaço por coisas simples e cotidianas, como por exemplo, tomar um banho, arrumar a mochila para a escola, ir à cozinha preparar o seu café, etc.
Muitas atividades parecem “sugar” a energia do jovem que demonstra uma posição de extremo cansaço.
3. Desinteresse em atividades diversas
O desinteresse por atividades que, antes, geravam prazer e bem-estar, também pode aparecer.
Por exemplo, se o adolescente sempre teve muito interesse em praticar um determinado esporte, mas de uma hora para outra cria “desculpas” para não jogar mais, ou simplesmente demonstra um grande desinteresse, pode ser que esse seja um dos sinais de depressão na adolescência.
4. Sentimento de inutilidade ou culpa
A baixa autoestima também tende a aparecer em casos de depressão na adolescência. O adolescente pode se diminuir constantemente, acreditando que é “inútil” para a família ou, ainda, que a sua existência pode ser um peso na vida das pessoas.
Essa “culpa” por “atrapalhar” a vida alheia vai minando a saúde mental do jovem, que acredita que não possui atributos e qualidades.
5. Dificuldade para manter o foco e a concentração
Seja por conta da fadiga, irritabilidade ou desinteresse, o adolescente pode começar a ter dificuldade para manter o foco e a concentração.
Além disso, a depressão na adolescência também pode atrasar e atrapalhar as tomadas de decisão do jovem, prejudicando a sua vida estudantil, pessoal, etc.
6. Apatia
A apatia costuma ser evidente em casos de depressão na adolescência. É como se nada chamasse a atenção do adolescente, ou quando chama, a fadiga o impede de ir até o fim.
O jovem pode demonstrar uma posição muito “passiva” frente aos mais diversos acontecimentos cotidianos, demonstrando uma falta de vontade – não consciente, mas sim decorrente das questões de saúde mental.
7. Distúrbios do sono
O sono do adolescente também pode ficar “perturbado” em casos de depressão. Isso pode aparecer de duas maneiras:
- Insônia: Seja com dificuldade para adormecer, ou com facilidade para acordar durante à noite, bem como dificuldade para voltar a dormir quando acorda de madrugada;
- Hipersonia: Quando o indivíduo sente um sono recorrente e intenso, sendo capaz de dormir por horas a fio, ultrapassando limites saudáveis e mantendo a sensação de cansaço após acordar.
Muitas vezes o sono excessivo também pode ser uma demonstração de que o adolescente, de modo inconsciente ou não, está tentando “fugir” da rotina difícil e desinteressante, ou seja, pode estar tentando fugir da dor, uma vez que dormindo não sente nada.
8. Pensamentos recorrentes sobre morte
Os pensamentos recorrentes sobre morte não estão relacionados apenas ao medo de morrer, mas sim, no caso da depressão na adolescência, o jovem pode imaginar que é inútil para a família e que a sua morte poderia ser um “alívio”.
Também é possível que as ideações e tentativas de suicídio apareçam na mente e nas atitudes do jovem, resultando em um comportamento grave que exige acompanhamento psiquiátrico o quanto antes.
9. Sintomas causam prejuízos sociais e funcionais
Além de ser detectado alguns ou vários dos sintomas que vimos até aqui, outra variável interessante pode ser considerada: se esses sintomas têm ocasionado prejuízos sociais ou funcionais para o adolescente.
Por exemplo, o simples fato de um adolescente que foi apaixonado por futebol deixar a atividade, pouco a pouco, de lado, não significa que ele tenha, de fato, depressão. Porém, se ele fazia parte de grupos sociais importantes ou a ausência do esporte está causando isolamento social, baixa autoestima, humor deprimido, etc., aí sim é interessante investigar.
Temos que ter em mente que os comportamentos, na adolescência, podem flutuar devido aos aspectos psicológicos da fase adolescente. Mas, é necessário ter um olhar bastante sensível para verificar quando essas mudanças causam prejuízos significativos ao jovem.
10. Distúrbios alimentares que impactam no peso
Os distúrbios alimentares também podem aparecer em casos de depressão na adolescência.
O jovem pode demonstrar uma falta de interesse em se alimentar, pulando refeições e perdendo peso. Bem como pode apresentar um comportamento mais impulsivo, consumindo muito acima do considerado adequado e normalmente associando o consumo a alimentos pobres em taxas nutricionais, como os doces.
A intervenção deve acontecer o quanto antes nesses casos, uma vez que o excesso ou a falta de alimentos pode resultar em outras comorbidades importantes e graves.
Quais as causas da depressão na adolescência?
As causas da depressão na adolescência podem ser multifatoriais e envolvem-se com uma série de questões singulares e circunstanciais. Segundo o DSM-V, os fatores abaixo podem resultar em quadros depressivos na adolescência:
1. Fatores temperamentais
Uma afetividade negativa pode aumentar as chances de o adolescente desenvolver um quadro de depressão ao longo de sua vida.
2. Fatores ambientais
Experiências adversas na infância, especialmente quando recorrentes e diversas, podem provocar um quadro de depressão no adolescente.
É o caso de viver em um ambiente em que há violência, negligência afetiva, problemas de relacionamento com os pais, casos de abuso, etc.
3. Questões genéticas e fisiológicas
Adolescentes que têm parentes com diagnóstico de depressão também podem desenvolver o quadro clínico. Além disso, questões fisiológicas, como desequilíbrios no próprio organismo, também podem ser uma das causas da depressão.
4. Uso de substâncias
O consumo de substâncias químicas também pode afetar, consideravelmente, a saúde mental do jovem. Sendo assim, pode ser caracterizado como mais uma das principais causas de depressão.
Porém, nem todo adolescente com depressão é usuário de substâncias químicas e os pais precisam ter isso em mente para não “acusar” o filho.
5. Presença de outros transtornos
Outros transtornos mentais, como transtorno de personalidade borderline e Transtorno de ansiedade, podem, com o passar do tempo, servir de estopim para o desenvolvimento de um caso de depressão.
Por isso, estar atento aos comportamentos e emoções dos filhos é um caminho para auxiliá-lo nas mais diversas situações, visando prevenir quadros de depressão e de outros distúrbios, síndromes e transtornos mentais.
Quais os tratamentos para depressão na adolescência?
Os tratamentos para depressão na adolescência incluem a atuação do psiquiatra e do psicólogo, para que seja possível oferecer um ambiente mais saudável e mais qualidade de vida para o jovem. Entenda:
Psicoterapia
Por meio da psicoterapia o jovem poderá falar e expressar as suas emoções, medos e anseios. Também poderá elaborar o que sente, compreendendo o que realmente pode estar acontecendo e aprendendo a lidar com situações adversas.
Traumas poderão ser trabalhados, a fim de minimizar o sofrimento psíquico do jovem.
Sua autoestima também será desenvolvida por meio da intervenção do psicólogo, uma vez que o profissional pode auxiliar o jovem a se enxergar por outras perspectivas.
As sessões podem ser semanais ou quinzenais, dependendo do caso clínico.
Tratamento medicamentoso
O tratamento medicamentoso será feito com o suporte de um Médico Psiquiatra, que poderá prescrever o medicamento mais adequado para o caso do adolescente.
Esse tratamento varia de acordo com a intensidade dos sintomas, idade do adolescente, questões de saúde, etc.
O psiquiatra acompanhará o jovem durante o tratamento, ajustando o medicamento quando necessário e dando um suporte a mais na hora de lidar com as sensações vividas na depressão.
Como ajudar um filho com depressão na adolescência?
Sem dúvidas, o diagnóstico de depressão na adolescência pode ser desafiador para a família, e não é para menos.
O quadro exige paciência e dedicação dos pais, que devem oferecer uma atmosfera respeitosa e acolhedora para o jovem em desenvolvimento.
A seguir, apresentamos algumas considerações que podem ser levadas em conta na hora de lidar com esse tipo de situação:
1. Apoie o tratamento do seu filho
Cuidado com os comentários que são feitos com relação às idas ao psiquiatra ou psicólogo. Jamais diminua o seu filho por estar em um tratamento para saúde mental. Mas sim, procure sempre apoiá-lo, incentivando-o a permanecer na psicoterapia e buscando saber mais sobre como tem sido o processo.
Claro que você não precisa perguntar exatamente o que o seu filho está falando para o psicólogo, mas demonstrar interesse, apenas questionando “como foi?” ou “foi tudo bem?” são ações que demonstram apoio e cuidado.
2. Não diminua a dor do seu filho
Nunca diga que a dor do seu filho é algo simples que irá passar. Jamais diga algo como “levante daí e se anime”, pois um depressivo não consegue fazer isso apenas por comandos verbais dessa forma.
Isso quer dizer que o seu filho tem consciência da situação que vive, mas não é simples tomar uma decisão de “levantar a cabeça e seguir adiante”.
Esse discurso machuca e diminui a dor do seu filho, anulando-a e, de quebra, ainda faz com que ele se sinta mais culpado.
Por isso, dê apoio a ele, diga que o entende e que estará ali para ajudá-lo a levantar quantas vezes e tentativas forem necessárias.
3. Acolha as emoções do adolescente
Acolha as emoções do seu filho. Escute-o. Permita-o chorar ou reclamar quando necessário. Deixe-o falar e “colocar para fora” o que sente.
Esse tipo de postura o ajudará a entender que ele pertence àquele local que está inserido, além de se sentir amado e acolhido pela família.
Esse apoio familiar pode ajudar na hora de compreender as próprias emoções e lidar com os momentos mais críticos da depressão na adolescência.
4. Jamais o compare ou o apresse
Nunca compare o seu filho com outro adolescente com ou sem depressão, tampouco apresse a recuperação do adolescente.
Esse tipo de postura, novamente, pode apenas aumentar o sentimento de culpa do adolescente, que se sentirá um “peso” no dia a dia das pessoas, agravando os sintomas.
5. Ajude-o a desenvolver a autoestima
Elogie o seu filho sempre que pertinente e converse com ele sobre os atributos que ele possui. Demonstre a importância e o valor que o jovem tem dentro da família, ajudando-o a fortalecer a autoestima.
6. Insira programas gradativos na rotina do adolescente
Não force a barra para o seu filho sair de casa e fazer mil e uma atividades. Porém, comece a incluí-lo em programas familiares, aos poucos. Comece com um piquenique no quintal, por exemplo, depois com uma partida de videogame entre pai e filho, etc.
À medida que o adolescente for “cedendo” a essas atividades, comece a incluir passeios, viagens, eventos fora de casa e assim por diante. Sempre respeitando o tempo e os limites do jovem.
7. Não invada o espaço do adolescente
Não invada o espaço do adolescente quando ele quiser ficar um pouco sozinho. Dê a ele a privacidade e o espaço necessário, ao longo do dia, introduzindo-o na rotina da família aos poucos, sem invadir a vida pessoal do seu filho de uma hora para outra.
Além disso tudo, lembre-se de que você também pode fazer psicoterapia para aprender a lidar melhor com as suas emoções e, consequentemente, com a forma como você interage com o seu filho. Buscar orientação profissional também é relevante. Pense nisso!
Referências
BAHLS, F. R. C.; BAHLS, S. Depressão na adolescência: características clínicas. Interação em Psicologia, 2002, 6(1), p. 49-57.
Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.
MONTEIRO, K. C. C.; LAGE, A. M. V. A depressão na adolescência. Dossiê – Psicologia e Adolescência • Psicol. Estud. 12 (2) • Ago 2007.