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Cannabis Medicinal

O que é a Cannabis Medicinal?

A Medicina Canabinoide se refere estudo do uso terapêutico de compostos químicos da planta de cannabis.

Diferentes relatos mostram que a canabis já vem sendo usada com fins medicinais há milhares de anos. No entanto, a criminalização da planta em diversos países faz com que estudos científicos relacionados a estes efeitos terapêuticos praticamente não existissem. Eles vieram a ser desenvolvidos especialmente a partir dos anos 1990, ganhando força no início dos anos 2000.

Podemos dizer assim que muitas das evidências relacionadas ao uso medicinal da Canabis são bastante recentes e que ainda há muito o que se estudar e descobrir. Limitações legais ainda são um empecilho para o uso e o estudo mais disseminado da Canabis.

Outra dificuldade é que os diferentes canabinoides agem de forma sinérgica, e a indústria ainda não foi capaz de reproduzir com rigor uma combinação desses componentes semelhantes aos da planta in natura. Isso significa que o extrato da planta ainda tende a ser mais efetivo do que os canabinoides isolados ou produtos sintéticos produzidos em laboratório atualmente disponíveis.

Existem diferentes cepas de canabis e mesmo as plantas da mesma cepa apresentam variações entre elas. Assim, os extratos da planta sempre apresentam variações entre sí, de forma que a padronização exigida pelos estudos científicos mais rigorosos é muito difícil de ser obtida.

Sistema endocanabinoide

o sistema endocanabinoide é um complexo sistema de sinalização celular que ajuda na manutenção da homeostasia do nosso corpo, ou seja, que ajuda a manter o corpo em equilíbrio.

Ele é formado por três componentes:

  • Receptores canabinoides;
  • Ligantes endógenos (endocanabinoides);
  • Enzimas que atuam na formação e degradação dos endocanabinoides.

Receptores endocanabinoides

Os receptores canabinoides são proteínas que podem ser ativdas pelos encocanabinoides e que estão amplamente distribuídos ao longo do corpo.

Existem dois tipos principais de receptores endocanabinoides:

  • CB1: encontrado primariamente no sistema nervoso central, mas também em outras partes do corpo em menor extensão. AJuda na regulação do apetite, no funcionamento de células imunes, na atividade motora, na coordenação, percepção de dor e na memória.
  • CB2: presentes no sistema adiposo, ossos, sistema cardiovascular, Sistema Nervoso Central, olhos, intestino, fígado, fins, trato respitatório e outros. Tem ação primordialmente periférica, embora também esteja presente em menor quantidade no sistema nervoso central.

Endocanabinoides

Endocanabinoides são substâncias produzidas pelo próprio corpo e que interagem com os receptores endocanabinoides, regulando o funcionamento de diferentes estruturas corporais. Os dois principais endocanabinoides são a Anandamida e o 2AG

Anandamida (AEA)

A N-araquidonoiletanolamina (AEA), também chamada de Anandamida, é a mais conhecida dos endocanabinoides. Seu nome deriva da palavra sânscrita “ananda”, que significa alegria, êxtase, felicidade suprema. É conhecida também pelo termo “receptor da felicidade”.

A anandamida é produzida a partir do metabolismo não oxidativo do ácido araquidônico em áreas do cérebro que são importantes para a memória, para o processamento do pensamento e para o controle do movimento.

No cérebro, ela influencia funções motoras, percepção de dor e tem ação antidepressiva (daí o nome de “substância da felicidade”). Em pequenas quantidades pode melhorar a memória, mas com quantidades excessivas pode causar a perda dela.

Fora do cérebro, a Anandamida tem papel na regulação do apetite, dilata vasos sanguíneos e ainda atua na fertilidade e gravidez. Ela está também envolvida na resposta inflamatória, o que justifica seus efeitos anti-inflamatórios, bem como no sistema imunológico.

2AG

Um segundo endocanabinoide descoberto, muito abundante no Sistema Nervoso Central , é o 2-Araquidonoil-Glicerol (2AG). Ele age tanto nos receptores CB1 quanto CB2, modulando a plasticidade sináptica dos processos de aprendizagem e memória.

Ele também é encontrado no coração, células endoteliais, células circulantes do sistema imune e plaquetas.

Palmitoiletanolamida (PEA)

PEA é um endocanabinóide sintetizado sob demanda em situações de estresse, lesões, inflamação e dor.

PEA tem importante papel na supressão da inflamação, inibindo a expressão de NF-kB (Fator Nuclear Kappa Beta) e reduzindo a atividade de enzimas pró-inflamatórias como CoX, eNOS e iNOS.(5)

Além disso, ele atua de forma indireta, promovendo o aumento da anandamida (AEA), o endocanabinoide mais potente, potencializando a sua ação farmacológica.

Fitocanabinoides

Fitocanabinoides são substâncias químicas presentes na planta de cannabis, que interagem com o sistema endocanabinoide do corpo humano.

A Canabis é uma planta complexa, com cerca de 426 entidades químicas, das quais mais de 100 são compostos canabinóides. Vale considerar, no entanto, que muitos desses compostos não são exclusivos da canabis, podendo também ser encontrados em outras plantas.

Os dois compostos principais são o Delta-9-tetrahydrocannabinol (THC) e o canabidiol (CBD), embora outros canabinóides também seja usados no meio clínico da Medicina Canabinoide (1).

Algumas condições se beneficiam mais do uso do CBD, enquanto outros se beneficiam mais do THC.

O THC e o Canabidiol agem de forma sinérgica em alguns receptores e tem efeitos opostos em outros. No entanto, é preciso considerar que os diferentes canabinoides interagem entre sí e que em muitos casos a combinação entre eles potencializa seus efeitos quando comparado com o uso de canabinoides isolados.

Canabidiol (CBD)

O CBD atua no sistema nervoso central e interage com a maioria das células do corpo humano.

Entre seus potenciais benefícios, incluem-se o efeito anti-inflamatório, ansiolítico, antidepressivo, relaxante muscular, antioxidante e neuroprotetor.

Ao contrário do THC, o CBD não tem efeitos psicotrópicos.

Tetrahidrocanabinol (THC)

O THC é responsável pelos efeitos psicotrópicos da cannabis, produzindo euforia e alterações da percepção. São esses efeitos que justificam seu uso recreativo da maconha.

Apesar de estar difundido no meio recreativo, o THC é uma substância promissora no tratamento de várias patologias, principalmente relacionado a dores.

Seus principais efeitos são: analgésico, relaxante muscular, antiemético, melhora do humor, sedativo e estimulador do apetite.

Esses benefícios estão relacionados tanto a sua ação direta como por conta do sinergismo que tem com o canabidiol.

Delta-8 Tetrahidrocanabinol (Δ8-THC)

O Delta8-THC é um isômero do THC que oferece benefícios semelhantes ao THC tem ação semelhantes ao THC, mas sem sua ação psicotrópica.

Extratos de espectro completo (Full Spectrum) X extratos isolados

Extratos Full Spectrum

O extrato de espectro completo ou Full Spectrum, é a forma de extração que preserva todos os compostos da planta Cannabis, o que inclui uma ampla variedade de fitocanabinoides e suas formas ácidas, além de substâncias como terpenos, flavonoides, entre outros fitoquímicos.

Diferente das alternativas sintéticas ou isoladas, o medicamento à base de Cannabis Medicinal com extração Full Spectrum preserva todos os compostos da planta, que oferecem uma ação múltipla e em cadeia.

Estudos sugerem, por exemplo, que associar o THC com o CBD potencializa os efeitos analgésicos, anti-inflamatórios e antieméticos ao mesmo tempo que minimiza os efeitos psicoativos do THC.

Não deixe de conferir, ainda, o teor de THC contido, já que essa é uma substância controlada e que não pode estar presente em concentrações maiores que 0,3%, a não ser que haja indicação médica.

Extratos isolados

Extratos isolados são submetidos a um intenso processo de purificação de forma a isolar canabinoides específicos, em especial o CBD e o THC.

O extrato de CBD isolado pode ser indicado para pessoas sensíveis aos efeitos psicoativos do THC.

No entanto, por conta da falta do efeito sinérgico entre o CBD e o THC, estudos indicam a necessidade de doses pelo menos 4 vezes superior para atingir os mesmos benefícios oferecidos pelos  extratos Full Spectrum, o que também potencializa os efeitos colaterais.

Regulamentação da Cannabis no Brasil

O uso industrial e comercial dos canabinoides já é regulamentado em aproximadamente de 50 países, mas com padrões bastante diversos.

No Brasil, as regulamentações vêm avançando bastante nos últimos anos, de forma que o que descrevemos aqui é o que temos agora em 2025.

Desde 2019, uma regulamentação da ANVISA se reporta aos produtos a base de Canabis em uma categoria própria, denominada de “produtos de canabis”. Esses produtos não são, portanto, classificados como medicamentos.

Com essa regulamentação, empresas de pessoa jurídica foram autorizadas a importar os produtos a base da canabis e revende-los para pessoas físicas mediante receita médica.

Foi permitido também a importação de insumos para a fabricação de produtos em solo brasileiro. No entanto, o plantio continua proibido.

Os médicos ganharam também uma maior liberdade para a prescrição.

Para se tornar um prescritor, médicos das diferentes especialidades

que desejam trabalhar com medicina canabinoide devem realizar um cadastro como “médico prescritor de Canabis” na Anvisa e no Conselho Federal de Medicina.

Com a prescrição, os pacientes conseguem importar ou comprar nas farmácias especializadas.

Vale considerar que o Brasil ainda não libera o cultivo da planta. Assim, toda a matéria prima usada nos canabinoides precisam ser importados.

Ainda existe no Brasil uma confusão regulatória e insegurança para a prescrição, com posicionamentos diferentes da Anvisa e dos conselhos de medicina

Indicações da cannabis medicinal

A cannabis medicinal vem sendo utilizada com graus variados de evidência para o tratamento de diferentes condições.

Ela não tem objetivo de cura de qualquer tipo de doença. Entretanto, em alguns casos, pode ser utilizada com o objetivo de controle dos sintomas e melhora da qualidade de vida.

Assim, ela deve sempre ser vista como um mecanismo auxiliar de tratamento prescrito pelo médico, não como método principal para o tratamento de doenças.

As principais indicações para uso incluem:

Dor crônica

O alívio da dor crônica é de longe a condição mais comum citada pelos pacientes para o uso médico de cannabis. Estudos mostram que aproximadamente 90% dos pacientes em uso de cannabis medicinal apresentam dor crônica (1, 2).

Existem evidências substanciais de que a cannabis é um tratamento eficaz para o alívio da dor crônica em adultos e que ela pode reduzir a necessidade de outros analgésicos para o alívio da dor, especialmente dos opióides.

Náusea e vômito induzidos por quimioterapia

As preparações orais de THC nabilona e dronabinol estão disponíveis para o tratamento de náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia há mais de 30 anos. Ambos foram considerados superiores ao placebo nestes pacientes.

Entretanto, ainda faltam estudos de qualidade comparando o THC com outras medicações disponíveis atualmente para tratar o problema (1).

Epilepsia

O canabidiol se mostrou eficiente no tratamento da epilepsia grave resistente ao tratamento tradicional (1). Para isso, ela deve ser usada junto, e não em substituição às outras medicações aprovadas para o tratamento da epilepsia.

O mecanismo de ação ainda não é totalmente reconhecido. Entretanto, um dos mais estudados envolve o potente efeito antioxidante do canabidiol.

Espasticidade da esclerose múltipla

O extrato oral de cannabis, nabiximol e THC oral se mostraram eficientes para o tratamento da espasticidade decorrente da Esclerose Múltipla. Entretanto, a melhora é limitada e não se deve esperar mudanças substanciais com os medicamentos (1).

Outras condições

A cannabis medicinal vem sendo proposta e testada para diversas outras finalidades, das quais existem evidências limitadas ou não existem evidências de benefícios (1).

Entre estas condições, incluem-se:

  • Doença de Parkinson
  • Demência
  • Lesão cerebral traumática
  • Transtorno bipolar
  • Ansiedade
    Glaucoma
  • Doença de Crohn
  • Problemas de sono
  • Sintomas de abstinência de heroína, morfina e outros entorpecentes opioides

Efeitos adversos dos canabinóides

O Canabidiol é seguro para ser usado por via oral ou borrifado sob a língua.

O risco de dependência existe por conta do THC, no caso de extratos full spectrum. No entanto, esse risco é menor do que muitas das substâncias alopáticas usadas para as mesmas finalidades. Alem disso, o tratamento da dependência tende a ser menor.

Além disso, o canabidiol pode ter efeitos colaterais como boca seca, redução da pressão arterial, diarreia, diminuição do apetite, alterações de humor, tontura e sonolência.