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Abordagem psicológica do paciente com demência

Abordagem psicológica do paciente com demência

A abordagem psicológica do paciente com demência busca oferecer acolhimento à família, o mantimento da autonomia do paciente e o aumento da qualidade de vida do sujeito e dos familiares à sua volta.

Afinal, o diagnóstico de demência pode ocasionar efeitos intensos na estrutura familiar e próxima ao indivíduo.

Por isso, investir em estratégias que minimizem os efeitos nocivos da enfermidade, visando um equilíbrio psicológico e emocional dentro dos limites possíveis, é um caminho promissor.

Neste texto, detalhamos algumas dessas considerações que são levadas em conta no tratamento psicológico de casos com demência, bem como oferecemos breves orientações que podem servir de reflexão para os familiares. Acompanhe.

Abordagem psicológica do paciente com demência

A abordagem psicológica do paciente com demência não possui um protocolo imutável. Inclusive, o ideal é que cada caso seja avaliado de forma singular, proporcionando o desenvolvimento de um tratamento alinhado às subjetividades do indivíduo e de sua família.

Abaixo, descrevemos informações relevantes sobre essa abordagem em casos de demência, a fim de clarificar dúvidas e oferecer um conhecimento capaz de emancipar.

Isso porque, o conhecimento frente aos casos clínicos e psiquiátricos contribuem para melhores tomadas de decisão, uma vez que paradigmas são quebrados e dados mais claros e reais são visualizados.

Acompanhe, portanto, a descrição breve de como a abordagem psicológica do paciente com demência contribui para a qualidade de vida do paciente:

1. Reconhecimento do problema e acolhimento
Reconhecer o problema não é tarefa fácil. Uma pessoa que recebe o diagnóstico de demência, seja qual for a doença envolvida com o quadro, pode se sentir desamparada, revoltada e abalada. E não é para menos.
O momento de descoberta do quadro ocasiona um luto na vida do sujeito e de sua família, que deve ser respeitado e atravessado dentro dos limites emocionais de cada um. Por isso, viver o momento de luto é muito importante, pois ele propicia o reconhecimento e a aceitação da situação, comuns em casos de lutos e perdas.
A partir desse reconhecimento, a busca por ajuda psicológica também é relevante. Dentro da psicoterapia, haverá o acolhimento e a escuta das emoções e das dúvidas do paciente, propiciando um ambiente de cuidados emocionais que foquem no aumento da qualidade de vida e bem-estar do sujeito.

2. Análise de mudanças ou adaptações ambientais
A abordagem psicológica do paciente com demência também considera a necessidade de haver mudanças ou adaptações no ambiente no qual o indivíduo está inserido.
É o caso de mudar o ambiente em que se dorme, se toma banho, faz suas refeições, etc., atentando-se às possíveis limitações de mobilidade e autonomia que possam começar a surgir em decorrência do quadro de demência.
Essas adaptações podem e devem ser feitas com o apoio da família, para que se crie um ambiente mais adequado e seguro para todos.

3. Implementação de hábitos saudáveis
Os hábitos saudáveis contribuem para a sensação de bem-estar e relaxamento, além de tirarem o foco total do diagnóstico. Além disso, proporcionam efeitos positivos na saúde do indivíduo, podendo, inclusive, retardar os efeitos da doença.
Sendo assim, cuidar do sono, manter uma alimentação saudável, praticar exercícios leves – como caminhadas -, são medidas que entram como possibilidades durante a orientação que é dada pelo psicólogo.
Isto é, o profissional da saúde mental auxilia o paciente na descoberta de atividades e hábitos que possam minimizar os efeitos negativos da doença, ao mesmo tempo em que se eleva a sensação de conforto frente aos sintomas.

4. Musicoterapia
A terapia com música pode propiciar sensações de relaxamento, conforto e bem-estar. O paciente pode desenvolver a sua inteligência espacial, dentro dos limites que a doença pode ocasionar, ao dançar em um ritmo que lhe agrade, por exemplo.
Além disso, é possível ouvir músicas agradáveis em momentos de estresse, movimentar o corpo de acordo com o ritmo, experimentar sensações diversas proporcionadas pelo contato com a música, entre outras situações complementares.
Inclusive, quando possível, aprender a tocar um instrumento ou manusear instrumentos musicais são ações que podem estimular a criatividade, a cognição e melhorar a qualidade de vida.

5. Tratamento focado em comorbidades psiquiátricas
Em alguns casos de demência, o indivíduo pode vir a desenvolver comorbidades psiquiátricas, como depressão, ansiedade, transtornos comportamentais, entre outros.
Sendo assim, a abordagem psicológica do paciente com demência também considera essa possibilidade, avaliando os sinais e sintomas de comorbidades que podem denunciar a necessidade de uma intervenção mais específica, voltada ao quadro psiquiátrico em questão.
O intuito sempre será promover qualidade de vida e bem-estar ao paciente que enfrenta os sintomas de comorbidades psiquiátricas e da própria demência.

6. Promover autonomia enquanto for possível
Enquanto for possível, a autonomia do paciente será considerada um dos maiores objetivos. Isso porque a autonomia proporciona qualidade de vida e bem-estar ao indivíduo que convive com um quadro de demência.
Por isso, sempre que necessário, mudanças poderão ser implementadas na rotina para que a pessoa mantenha a sua autonomia o máximo que puder.
Por exemplo, se o indivíduo começa a ter dificuldades para se alimentar, devido à instabilidade do movimento com as mãos, pode ser interessante a mudança nos talheres e louças que são usadas nas refeições. Assim, mantém-se a segurança do paciente e este poderá se alimentar, mesmo com as limitações, de forma autônoma (com supervisão em casos mais avançados).
Desse modo, enquanto for possível manter essa autonomia, o psicólogo orientará a família e o próprio paciente quanto às ações que podem ser postas em prática.
Avaliar isso em conjunto, entendendo que os quadros de demência desencadeiam limites significativos, é uma forma de garantir que a autonomia, de acordo com as limitações do paciente, seja respeitada o máximo possível.

7. Cuidados paliativos em casos mais avançados e com ameaça à vida
Normalmente, é mais comum ouvir falar em cuidados paliativos no caso de câncer, porém, em outras situações, como demência, esse tipo de acompanhamento também pode ocorrer.
Isto é, em casos nos quais a doença está mais avançada, a abordagem psicológica do paciente com demência foca nos cuidados paliativos.
Esses cuidados visam oferecer qualidade de vida nos momentos finais do paciente, quando a doença é irreversível e não há mais perspectiva de cura ou estabilização.
Aqui, foca-se no controle da dor, seja ela física ou emocional; controle de outros sintomas que podem ser psicológicos, sociais e emocionais; entre outras questões relacionadas.

Como a família pode lidar com um caso de demência em um familiar?

Até aqui, pudemos ver uma série de fatores que são levados em conta na abordagem psicológica do paciente com demência. Agora, discutiremos alguns pontos que a família pode colocar em prática na hora de proporcionar um ambiente mais acolhedor e tranquilo para o paciente.

Tudo isso, obviamente, sem deixar de lado a saúde mental da própria família, que também enfrenta desafios diante de um diagnóstico de demência em um familiar. Acompanhe.

1. Buscar apoio psicológico e psicoeducação
Um ponto inicial que pode fazer a diferença no bem-estar de toda a família é o acompanhamento psicológico de cada membro familiar. Esse acompanhamento pode se basear na terapia familiar ou individual, de acordo com o que vier a ser mais adequado para os sujeitos.
Nesse acompanhamento psicológico, torna-se possível tirar dúvidas, falar sobre as emoções, pensar nas angústias e medos da família, encontrar suporte emocional, e assim por diante.
Além disso, o psicólogo poderá oferecer o processo de psicoeducação, que visa:

  • Apresentar informações e conhecimentos importantes sobre o quadro de demência.
  • Tirar dúvidas sobre o quadro e o que possa envolvê-lo.
  • Orientar sobre as formas de agir frente às crises e problemas provenientes da demência.
  • Acolher os questionamentos e oferecer suporte emocional frente a eles.
  • Abrir um caminho para que se fale sobre o que se pensa da situação, visando entender melhor o que pode estar acontecendo.

Essa psicoeducação oferece uma base de conhecimento para que a família possa encontrar, na ciência e nos tratamentos comprovados, formas de atuar frente ao diagnóstico.
Em paralelo a isso, a psicoterapia propicia um cuidado a mais com a saúde mental e emocional de cada indivíduo.

2. Identificar situações que exijam adaptações ambientais
A família também pode analisar e averiguar quais situações podem requerer adaptações ambientais para o familiar adoecido.
É o caso de fazer adaptações para manter a mobilidade; adaptações que promovam a autonomia do sujeito; e assim por diante.
Essas mudanças podem ocorrer de forma gradativa e à medida que o quadro avança ou se estabiliza, sempre implementando ações que contribuam para a autonomia do paciente.

3. Introduzir estímulos e distrações para lidar com comportamentos agressivos
Durante o percurso da doença, o paciente pode começar a apresentar comportamentos mais agressivos e menos adaptados à sociedade. Esses comportamentos podem trazer angústias e dúvidas à família, o que é natural.
No entanto, introduzir estímulos e distrações nesses momentos pode ajudar a família e o próprio paciente a atravessarem os momentos de crise.
Por exemplo, se o paciente demonstra muita resistência na hora de se trocar ou se banhar, é possível que a família introduza estímulos musicais que o relaxem e o distraiam.
Pensar em alternativas que tirem o foco do comportamento disfuncional e propiciem respeito, bem-estar e conforto são medidas bem interessantes.

4. Evitar o confronto com o paciente
Infelizmente, o paciente com demência pode, em algumas situações, apresentar comportamentos deturpados e agressivos. Isso é muito comum devido à degeneração cerebral que ocorre nessas situações.
Sendo assim, confrontar o paciente não é um caminho indicado por especialistas. Como vimos acima, introduzir estímulos e distrações é um percurso mais saudável e respeitoso para com o paciente, diferente dos confrontos e das discussões que são infrutíferas.
Lembre-se de que muitos comportamentos e confusões mentais, que podem aparecer no paciente com demência, não são “culpa” dele, tampouco uma escolha consciente e assertiva.
Portanto, não o culpe e não o confronte crendo que é isso que irá resolver o problema, pois sabemos que não será dessa forma que se tornará viável a mudança de determinadas atitudes do sujeito.
Respeitar o espaço do outro e buscar novas formas de concluir tarefas, distraindo-o e não confrontando-o, pode ser menos conflituoso e até mesmo menos doloroso para ambos os lados.

5. Incentivo à autonomia enquanto for possível
Sempre que possível, a família pode incentivar a autonomia do sujeito, pois isso pode elevar a autoconfiança e o bem-estar dele.
Por exemplo, ao invés de simplesmente retirar o talher da mão do sujeito com demência, tentando alimentá-lo por conta própria, que tal oferecer talheres mais adaptados e que o ajudem a se alimentar sozinho, porém, com a sua supervisão?
Perceba que, nesse cenário, o indivíduo recebe ajuda e supervisão, mas ainda mantém sua a autonomia dentro de um limite possível que pode fazer toda a diferença para ele.
Enquanto houver essa possibilidade, usufruam disso. Essa autonomia pode gerar muito bem-estar ao sujeito.

6. Dar apoio e oferecer uma comunicação clara e adequada à situação
Estar presente, dando apoio emocional, escutando ativamente e comunicando-se de forma adequada, de acordo com os limites do paciente com demência, também é um papel da família.
Lembre-se de que o indivíduo também está sofrendo e está diante de um momento difícil de sua vida. No começo, com a consciência do diagnóstico, pode ser ainda mais doloroso para ele, por isso, dar apoio, escutar e acolher são medidas que a família pode colocar em prática todos os dias.
Sabemos que todos estão sofrendo nessa situação. Mas o fortalecimento do vínculo familiar, com foco no respeito às emoções e limites de cada um, é um caminho rico e que proporciona um espaço mais acolhedor e respeitoso para todos.

7. Oferecer atividades de recreação, estímulo criativo e estimulação multissensorial
A família também pode oferecer atividades de recreação, estímulos criativos e estimulação multissensorial para o paciente com demência.
É o caso de implementar na rotina atividades como:

Atividades de pintura e desenho, que estimulam a criatividade, minimizam a sensação de estresse e proporcionam momentos de interação com a família.
Estimular atividades voltadas à musicoterapia, como dança, tocar instrumentos ou, simplesmente, ouvir ritmos e melodias diferentes.
Oferecer atividades de contação de histórias que estimulem a imaginação, a memória e a criatividade.
Proporcionar atividades manuais diversas, como artesanatos com recorte, colagem, modelagem, costura, entre outros que possam atender aos limites do paciente em questão.
Entre outras atividades que estimulem as mãos, a audição, o visual, a criatividade, etc.

Essas atividades podem ser praticadas em conjunto, com a família, fortalecendo o vínculo, proporcionando um suporte emocional e desencadeando momentos que fomentarão lembranças inesquecíveis para toda a família.

Lembre-se, ainda, de sempre considerar o que o médico orienta que a sua família faça frente ao diagnóstico de demência. Afinal, este conteúdo não exclui o acompanhamento de profissionais. Até porque com o acompanhamento alinhado às singularidades do caso na sua família, torna-se viável pensar em estratégias mais adequadas à sua realidade. Cuide-se e cuide da sua família com o apoio de profissionais competentes.

Referências
CARAMELLI, P.; BOTTINO, C. M. C. Tratando os sintomas comportamentais e psicológicos da demência (SCPD). Conferência Clínica • J. bras. psiquiatr. 56 (2) • 2007.

CHAVES, J. C. et. al. Tratamento farmacológico e assistência psicológica na doença de Alzheimer. Revista Saúde em Foco – Edição nº 10 – Ano: 2018.

RIBEIRO, A. S. R. Prática de cuidados paliativos em idosos com demência. 2017. 20 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Saúde da Pessoa Idosa) — Universidade de Brasília, Brasília, 2017.