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Uso da Cannabis no tratamento da dor

Uso da Cannabis no tratamento da dor

O alívio da dor crônica é de longe a condição mais comum citada pelos pacientes para o uso médico de cannabis. Estudos mostram que aproximadamente 90% dos pacientes em uso de cannabis medicinal apresentam dor crônica (12).

Existem evidências substanciais de que a cannabis é um tratamento eficaz para o alívio da dor crônica em adultos e que ela pode reduzir a necessidade de outros analgésicos para o alívio da dor, especialmente dos opióides.

Discutimos nesse artigo o pepel da cannabis no tratamento da dor. Antes de ler esse artigo, é importante compreender as bases do uso da cannabis medicinal, incluindo mecanismos de ação, o sistema endocanabinoide  e as diferentes opções de produtos. Discutimos mais sobre isso em um artigo sobre a Medicina Canabinoide.

Como os canabinóides agem sobre a dor?

O sistema endocanabinoide tem um papel relevante no tratamento da dor. Células neurais e não neurais são capazes de produzir substância endocanabinoides, que por sua vez modulam a liberação de neurotransmissores no cérebro e na medula espinhal. Dessa forma, os endocanabinoides podem atenuar a sensibilização dolorosa e a inflamação, processos esses intimamente ligados à cronificação da dor.

Os receptores CB1 estão presentes em neurônios sensoriais nociceptivos e não nociceptivos, bem como em células de defesa, como macrófagos e mastócitos. Já os receptores CB2 estão presentes em pequenas quantidades no cérebro, medula espinhal e gânglio da raiz dorsal, mas aumentam em resposta a danos nos nervos periféricos. Assim, eles regulam as interações neuroimunes e interferem na hiperalgesia inflamatória.

Por fim, é preciso considerar também que o paciente com dor crônica habitualmente apresenta um quadro complexo e que pode envolver outras comorbidades, como transtornos de humor, transtornos de ansiedade e problemas com o sono. Todas essas condições podem de alguma forma ter uma melhora com o uso dos canabidiois.

Quais as preocupações com o uso dos canabinoides para dor?

Embora os estudos mostrem bastante evidências no sentido de controle da dor com os canabinoides, existem preocupações que não podem ser relevadas, como os efeitos de longo prazo na dor, risco de dependência e com o déficit cognitivo.

Efeitos de longo prazo na dor

O uso de opióides no longo prazo deve sempre que possível ser evitado. Isso porque com o tempo o efeito analgésico deles diminuem. Com maiores doses, cada vez mais os efeitos colaterais preponderam em relação ao efeito analgésico.

Além disso, o uso prolongado de opioides pode tornar as pessoas mais reativas à dor. Um trauma agudo, por exemplo, fará com que pessoas em uso de opióides tenham mais dor do que aquelas que não usam esses medicamentos.

A retirada do opioide, por outro lado, pode levar a uma potencialização da dor e efeito de hiperalgesia.

Embora isso não esteja claro em que extensão isso acontece com o uso da cannabis, é preciso considerar que a cannabis e os opioides compartilham algumas das mesmas vias de alívio da dor. Assim, existe a preocupação de um efeito semelhante no longo prazo.

Dependência Química

Estima-se que uma em cada 10 pessoas que usam cannabis desenvolverá, sintomas de dependência, sendo que aproximadamente 30% dos usuários apresentam sinais de dependência.

Embora essa seja uma preocupação, os números são inferiores àqueles dos opioides. Além disso, os perigos com a dependência à cannabis é menor do que com os opioides, considerando que não existe relato de qualquer caso no mundo de morte por overdose de canabis – algo muito comum na dependência por opioides.

Por fim, a dependência é mais fácil de ser tratada, sendo que a síndrome de abstinência de cannabis normalmente tem um curso que pode persistir por aproximadamente 14 dias após a descontinuação.

Perda cognitiva

Embora muitas vezes relevada pelos ativistas da maconha, o comprometimento cognitivo de fato é um problema, pode ocorrer tanto com o uso agudo quanto crônico. Os efeitos cognitivos adversos podem ser piores do que com o uso crônico de opioides.

Esses efeitos sobre a cognição estão relacionados especialmente ao THC, presentes na maconha para uso recreacional e também nos produtos cannabis de full spectrum.

Essa preocupação é válida especialmente no caso de crianças e adolescentes, o que exige cuidado redobrado com esse público. Sempre que possível, deve-se dar preferência aos produtos de CBD isolado entre crianças e adolescentes. O uso do THC pode ser considerado em alguns casos pesando-se os riscos e benefícios. No entanto, é fundamental que isso seja conduzido por profissionais com grande experiência no uso da Cannabis.

Quando os canabinoides devem ser usados no tratamento da dor?

Embora a Cannabis seja eventualmente usada em monoterapia no tratamento da dor crônica, ela é mais comumente prescrita como coadjuvante de outros medicamentos analgésicos, incluindo os opioides, especialmente na falha desses medicamentos.

O principal benefício descrito com o uso dos canabinoides no tratamento da dor é justamente a possibilidade de permitir uma redução na dose dos opioides.

Quais os melhores produtos cannabis para o tratamento da dor?

O canabinoide que tem o potencial analgésico mais importante é o delta-9-THC, presente nos produtos full sprectrum. O THC se liga diretamente aos receptores de anandamida do sistema endocanabinoide, retromodulando a liberação de neurotransmissores na fenda sináptica.

O Canabidiol (CBD) também apresenta um efeito analgésico, porém de menor intensidade do que o THC. Estima-se que o CBD isolado precise de uma dose 4 a 6 vezes maior para obster o mesmo efeito analgésico, quando comparado com os produtos full spectrum.

Produtos sem o THC, como o CBD isolado ou os produtos broad spectrum, podem ser isolados quando o THC for uma preocupação maior, como no caso de crianças ou adolescentes ou de pessoas com arritmia cardíaca.

Vale considerar aqui que a resposta aos medicamentos, incluindo a cannabis, é muito individual. Os efeitos são diferentes em diferentes pacientes e as doses podem ser muito variáveis, não devendo portanto ser padronizada ou seguir uma “receita de bolo”.