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Testosterona e esteroides anabolizantes em Mulheres

O que é a testosterona?

A testosterona é um hormônio produzido principalmente nos testículos, sendo considerado um hormônio sexual masculino.

No entanto, ela também é produzida em baixas doses pelos ovários femininos e também nas glândulas suprarrenais tanto dos homens quanto das mulheres. Ainda assim, Os níveis de testosterona em homens são muito maiores que nos mulheres.

Os efeitos da testosterona podem ser divididos em dois grupos:

  • Efeitos anabolizantes: estímulo para a síntese de proteínas, com consequente ganho massa muscular e a força. Dentre os efeitos anabólicos, também podemos considerar o aumento da eritropoiese, que é o processo de produção dos glóbulos vermelhos do sangue.
  • Efeitos androgênicos: relacionados ao desenvolvimento de características sexuais masculinas, incluindo o crescimento de pelos faciais e corporais, mudanças no tom de voz, aumento da massa muscular e manutenção da saúde óssea.

A testosterona Influencia, ainda, a libido, a função sexual, o humor, a cognição e a disposição.

Esteroides anabolizantes

Os Esteroides Anabolizantes são um grupo de moléculas que incluem a testosterona e também seus derivados sintéticos.

OS derivados da testosterona são compostos sintéticos desenvolvidos com o objetivo de potencializar os efeitos anabólicos dos esteroides ao mesmo tempo em que se minimizam os efeitos androgênicos.

Precisamos considerar no entanto que nenhum desses derivados é capaz de dissociar totalmente os efeitos androgênicos dos efeitos anabólicos.

Testosterona baixa em mulheres

Nenhum nível de corte nos valores de Testosterona Total deve ser usado para diferenciar mulheres com e sem deficiência de testosterona.

Exames de testosterona só devem ser utilizados em mulheres na suspeita de níveis elevados do hormônio, não sendo indicados para identificar deficiência hormonal.

Nenhum teste disponível atualmente tem sensibilidade para caracterizar níveis hormonais dentro do que se espera para a mulher. Assim, mesmo um exame com testosterona zerada não deve ser visto como anormal ou deficiente.

A única condição em que o uso médico da testosterona é indicado para mulheres é o Desejo Sexual Hipoativo após a menopausa. Mesmo nesses casos, o hormônio está longe de ser a primeira opção de tratamento.

Um consenso referendado pelas principais sociedades de especialidade, incluindo entre outras a International Menopause Society, a Endocrine Society, a European Menopause and Andropause Society, a International Society for Sexual Medicine, a International Society for the Study of Women’s Sexual Health (4):

chegou às seguintes conclusões em relação à reposição de testosterona em mulheres:

  • Nenhum nível de corte nas dosagens de testosterona deve ser usado para caracterizar a Testosterona Baixa Feminina;
  • Não há dados suficientes para recomendar o uso de testosterona em mulheres na pré-menopausa para o tratamento da função sexual ou qualquer outro resultado;
  • Não há evidências suficientes para apoiar o uso de testosterona para melhorar o desempenho cognitivo, ou para retardar o declínio cognitivo, em mulheres na pós-menopausa;
  • Os dados disponíveis não referendam o tratamento com testosterona no tratamento da osteoporose feminina;
  • Nenhum efeito estatisticamente significativo na massa corporal magra, gordura corporal total ou força muscular deve ser atribuído à testosterona.

Infelizmente, muitas pessoas vêm atualmente sendo induzida ao uso fora das indicações médicas, com métodos que sugerem um benefício irreal para a saúde e minimizando os riscos em potencial.

Esses tratamentos podem receber denominações como “modulação hormonal” ou “tratamento anti-aging”, métodos esses condenados por todas as sociedades médicas reconhecidas.

Testosterona e menopausa

A menopausa é muitas vezes usadas como justificativa para a prescrição dos esteroides anabolizantes.

Quando indicada, no entanto, a Terapia de Reposição Hormonal pós menopausa deve ser feita com hormônios femininos, não com a testosterona ou outros esteroides anabolizantes.

Nas mulheres, apenas 25% da produção da testosterona é produzida nos ovários. O restante é produzido nas glândulas suprarrenais ou por meio da conversão periférica dos hormônios femininos. Assim, os níveis de testosterona são pouco afetados pela menopausa.

Existe dose segura da testosterona na mulher?

Esteroides anabolizantes vêm sendo utilizado por mulheres através da reposição oral, intramuscular e sob a forma de chip (popularmente conhecidos como “chip da beleza”).

Ainda que muitas vezes indicadas como forma de reposição hormonal (o que nos faz pensar em elevar os níveis do hormônio para valores fisiológicos), na prática muitas mulheres estão buscando níveis mais elevados do hormônio, além do que seria esperado para a mulher pré-menopausa. Os riscos, nestes casos, serão maiores quanto mais elevadas as doses.

Uma alegação muito comum de quem advoga pelo uso da testosterona e outros esteroides anabolizantes (a maioria formada por não especialistas) está relacionado à dose: “A diferença entre o remédio e o veneno está na dose”, dizem.

Ainda que o risco de complicações e efeitos colaterais aumente com o aumento da dose e do tempo de uso, a segurança da terapia de testosterona em longo prazo, mesmo dentro de valores considerados fisiológicos, ainda não foi estabelecida.

Isso significa que não existe uma dose considerada totalmente segura e a prescrição deve sempre considerar os potenciais riscos e benefícios.

Outro problema é que na maioria dos países, incluindo o Brasil, não existem formulações aprovadas para uso dentro das doses que seriam recomendadas para as mulheres.

O uso, quando indicado, é feito a partir da manipulação e do fracionamento das doses indicadas para os homens, o que aumenta significativamente o risco de super-dosagens acidentais ou não tão acidentais.

Chip da Beleza

Popularmente conhecido como “chip da beleza”, o Implante hormonal é uma terapia não convencional e não aprovada pela maioria dos órgãos públicos e associações médicas mundiais.

No Brasil, a ANVISA publicou em Outubro de 2024 uma Resolução com a suspensão da manipulação, da comercialização, da propaganda e do uso de implantes hormonais manipulados. Vale lembrar também que não existem implantes semelhantes registrados pela agência.

A Gestrinona é um dos hormônios mais utilizados nos chips. Ela foi inicialmente usada por administração oral no tratamento da endometriose. Já os implantes foram colocados no mercado com o objetivo de contracepção, controle da TPM e reposição hormonal pós menopausa.

Devido aos seus efeitos androgênicos (como diminuição de gordura e aumento de massa muscular), esse implante tem ganhado fama entre as mulheres que buscam melhora do desempenho físico e estético. Habitualmente, múltiplos implantes são usados nestes casos.

A ausência de estudos de longa duração que mostram sua real eficácia e segurança é o principal motivo para sua desaprovação pelas principais agências regulatórias ao redor do mundo.

Somado ao pouco conhecimento sobre o hormônio, temos o fato dele ser sinteticamente manipulado sem regulamentação rigorosa e específica, o que envolve um risco real de superdosagem (em muitos casos proposital).

Veja aqui o posicionamento da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) em relação aos implantes hormonais / chips da beleza.

 

Consequências do abuso da testosterona na mulher

Muitos dos efeitos da testosterona em mulheres são equivalentes ao que se observa nos homens. No entanto, considerando os baixos níveis naturalmente circulantes de testosterona em mulheres, pequenos aumentos pode ter um impacto muito mais relevante para elas.

Estudos mostram que até 58% das mulheres desenvolvem deoendência aos anabolizantes, contre 23% dos homens. Já os distúrbios psiquiátricos acontecem em 50% das mulheres, contra 22% dos homens.

Entre os efeitos adversos mais comuns incluem-se:

  • Alterações na Libido, menstruação e fertilidade
  • Engrossamento da voz
  • Efeitos dermatológicos
  • Efeitos Cardiovasculares
  • Efeitos hepáticos
  • Efeitos neuropsiquiátricos
  • Dependência Química

Libido, menstruação e fertilidade

Os esteroides anabolizantes levam a uma supressão da produção dos hormônios LH e FSH pela hipófise. Sem esses hormônios, a produção de estrogênio e testosterona ficam inibidas e amenstrução fica desregulada ou ausente.

Com o fim do uso dos anabolizantes, o ciclo hormonal tende a retornar normalmente, bem como a fertilidade.

A falta de estrogênio e progesterona pode afetar negativamente o desejo sexual. Vale aqui considerar que a libido, tanto em homens como em mulheres, tem muito mais relação com os níveis de estrogênio do que com os níveis da testosterona em sí.

Por fim, a testosterona pode levar a um aumento significativo no tamanho do clitóris, efeito esse que não é revertido com a interrupção dos anabolizantes.

Engrossamento da voz

As cordas vocais são formadas por músculos e não estão isentas do efeito dos anabolizantes. Quando hipertrofiadas, a voz fica mais grossa.

Os efeitos sobre a voz não são reversíveis com a interrupção do uso. A única forma de se conseguir isso é por meio de cirurgia, que ainda assim pode ter resultado limitado e abaixo do desejado.

Efeitos dermatológicos

Esteroides anabolizantes podem provocar acne, queda de cabelo (alopecia), estrias, aumento nos pelos com padrão masculino (hirsutismo) e furúnculos nos locais de injeção.

Efeitos Cardiovasculares

Os anabolizantes promovem um aumento na produção de glóbulos vermelhos, tornando o sangue mais viscoso e lento.

Com isso, o risco de fenômenos tromboembólicos aumenta, incluindo o Infarto Agudo do Miocário (IAM) e o Acidente Vascular Cerebral (AVC).

Junto com isso, há também um aumento na pressão arterial e aumento nos níveis de colesterol ruim (LDL e VLDL) e redução nos níveis de colesterol bom (HDL), com maior deposição de placas de gordura nas artérias. Esse é mais um fator que contribui para um risco elevado de fenômenos tromboembólico.

Os anabolizantes também levam a um aumento na espessura do músculo cardíaco, especialmente no septo interventricular. O problema é que esse musculo espessado apresenta características distintas de um musculo cardíaco normal, com maior risco para arritmias potencialmente fatais e redução na capacidade de contração.

A hipertrofia cardíaca costuma permanecer por até um ano após o fim do uso dos anabolizantes. No entanto, a perda da força da contração pode ser irreversível.

Efeitos hepáticos

Alguns esteroides anabolizantes podem exercer um efeito tóxico sobre as células do fígado, levando à morte celular e a uma resposta inflamatória no fígado.

A inflamação crônica pode levar a danos permanentes no fígado, como fibrose e cirrose hepática. Além disso, algumas dessas pessoas podem evoluir com uma hepatite fulminante inclusive com a necessidade de transplante de fígado.

O risco de hepatotoxicidade  é especialmente alto com o uso de anabolizantes orais, que tiveram sua estrutura modificada para impedirem o metabolismo hepático de primeira passagem, tornando a depuração mais lenta.

Efeitos neuropsiquiátricos

Problemas de saúde mental têm sido vistos como um possível gatilho relacionado ao início do abuso. Seria uma estratégia de enfrentamento durante momentos de dificuldade emocional, incluindo estresse, ansiedade, depressão, raiva e solidão.

Por meio dos esteroides anabolizantes, essas pessoas obtêm uma sensação de controle sobre suas vidas, usando a imagem corporal como uma forma de lidar com emoções difíceis.

O uso sustentado de esteroides anabolizantes, por sua vez, está relacionado a alterações cerebrais tanto do ponto de vista estrutural como funcional, podendo com isso piorar problemas de saúde mental pré-existentes ou levar ao aparecimento de novos transtornos mentais.

Entre os possíveis efeitos neuropsiquiátricos dos anabolizantes, incluem-se agressão, violência, impulsividade e oscilações no humor. No longo prazo, eles estão associados também a deficiências cognitivas e perda da memoria. Dependendo do caso, os anabolizantes podem tanto aliviar como causar depressão.

Por fim, os sintomas neuropsiquiátricos estão entre os problemas mais comuns durante o período de abstinência, quando a pessoa não se encontra sob o efeito das drogas.

Precisamos considerar no entanto que estes efeitos se relacionam não apenas à testosterona, mas também ao estrogênio. Vale aqui lembrar dos conhecidos efeitos da Tensão Pré Menstrual tipicamente vistos em mulheres por conta das variações os níveis de hormônios femininos.

Dependência Química

A dependência química e os sintomas de abstinência são menos comum em mulheres, devido às menores doses habitualmente utilizadas. Quando presentes, é preciso também considerar o impacto da variação dos niveis de estrogênio para esses efeitos.

São sinais da dependência por esteroides anabolizantes:

:

  • Usar a substância por períodos mais longos e em quantidades maiores do que o pretendido;
  • Passar a maior parte do tempo tentando obter a substância;
  • Ter um forte desejo ou anseio de usar os esteroides anabolizantes;
  • Desistir de atividades sociais, recreativas e outras atividades importantes para usar o esteroide anabolizante;
  • Continuar a usar o esteroide anabolizante, mesmo que ciente das sérias consequências legais, médicas e sociais.

Como largar os esteroides anabolizantes

Os motivos para largar os esteroides anabolizantes são diversos. Alguns procuram ajuda após o diagnóstico de complicações médicas. Outros por tomarem consciência de problemas vivenciados por outros usuários do seu convívio.

Muitos buscam ajuda por conta da infertilidade, com o desejo de ter filho.

Para aqueles que abusam dos anabolizantes há longa data e em altas doses, essa retirada pode não ser simples. Além dos sintomas de abstinência, é preciso avaliar e tratar a supressão gonadal e outras consequências do abuso dos anabolizantes.

Uma estratégia a ser considerada pode ser a substituição dos anabolizantes sintéticos pela testosterona, com redução gradativa da dose. Isso ajuda a reduzir o risco de abstinência e outros efeitos colaterais.

Por fim, algumas pessoas com histórico de abuso mais pesado dos anabolizantes ou que já tiveram tentativas fracassadas prévias de largar o vício podem se beneficiar de uma desintoxicação assistida por médicos, inclusive com internação em clínicas para dependentes químicos.

Sintomas de abstinência

A fadiga é geralmente o primeiro sintoma observado com a redução ou a retirada dos esteroides anabolizantes. Além disso, irritabilidade, dor de cabeça e náusea podem estar presentes. Esses sintomas começam de forma leve em algum momento dentro de cinco dias da última dose.

Nos dias seguintes, os sintomas tendem a aumentar, incluindo especialmente sintomas psicológicos como depressão e ansiedade. Dores abdominais, náusea, perda de peso e insônia podem estar presentes. Os sintomas de abstinência geralmente atingem o pico na segunda semana, quando passam a diminuir gradativamente.

Ainda que os parâmetros acima possam ser vistos como uma boa referência, a duração e a gravidade dos sintomas variam de acordo com uma série de fatores, incluindo:

  • Tipos de esteroides anabolizantes;
  • Tempo de uso;
  • Frequência e modo de uso;
  • Abuso concomitante de outras substâncias, como álcool ou tabaco;
  • Saúde mental e outras condições de saúde.

Todos esses pacientes devem ser acompanhados de perto. Uma vez identificado os sintomas de abstinência, esses devem ser tratados de forma sintomática.