Infecções congênitas
Qual a importância da investigação de infecções congênitas?
Muitas infecções maternas podem se desenvolver de forma assintomática e sem o conhecimento da mãe. Ainda assim, elas estão entre as principais causas de malformações ou complicações obstétricas.
A identificação precoce das infecções e o início do tratamento permite em alguns casos minimizar esses riscos. Além disso, o diagnóstico precoce pode levar a mudanças no planejamento do parto (incluindo a indica;cão para cesárea) ou o planejamento de intervenções precoce ao nascimento, para minimizar o risco de contaminação do bebê.
HIV
Quando uma mãe é portadora do vírus, a infecção congênita do HIV geralmente acontece durante o parto ou após o nascimento, por meio da amamentação. A transmissão transplacentária, durante a gestação, é incomum.
Esta contaminação pode ser evitada por meio da identificação precoce da mãe infectada durante o acompanhamento pré-natal (a mãe pode desconhecer ser portadora do HIV até então), tratamento da mãe com medicamentos antirretrovirais (buscando-se minimizar sua carga viral) e pela alimentação do bebê com as fórmulas infantis (sem o leite materno).
O parto cesária também pode ser considerado, embora gestantes com carga viral não detectada tenham segurança para a realização do parto vaginal (1).
Com estes cuidados, o risco de contaminação do bebê fica muito baixo, de forma que a transmissão vertical do HIV (da mãe para o filho) se tornou bastante incomum no mundo desenvolvido.
Toxoplasmose
A toxoplasmose é uma infecção causada por um protozoário chamado “Toxoplasma Gondii”, sendo uma das zoonoses (doenças transmitidas por animais) mais comuns em todo o mundo.
Já a toxoplasmose congênita é uma das formas mais comuns de infecção congênita, acometendo aproximadamente 1 a cada 3.000 nascidos no Brasil. Ela acontece quando a mãe contrai a toxoplasmose primária durante a gestação.
Ela é transmitida por meio do consumo de água ou hortalícias contaminados pelas fezes de gato ou outros felinos, bem como pelo consumo de carne contaminada mal-passada.
Para evitar a toxoplasmose congênita, a gestante deve evitar carnes cruas ou mal-cozidas, bem como o consumo de água não filtrada. Também deve evitar o contato com fezes de gato.
Bebês com toxoplasmose congênita apresentam altos índices de prematuridade, retardo do crescimento intrauterino, anormalidades liquóricas e cicatrizes oculares.
70% dos bebês não apresentam qualquer sinal da doença ao nascimento, sendo desta forma definidos como uma infecção sub-clínica. Ainda assim, a maioria deles virão a apresentar manifestações tardias da doença, especialmente quando não tratados.
Estima-se que o risco de transmissão seja de 15% quando a infecção ocorre no primeiro trimestre, 25% no segundo trimestre e até 65% no terceiro trimestre.
O risco de sequelas, por sua vez, é inversamente proporcional ao período gestacional. Quanto mais precoce ela acontece, piores são as consequências para o bebê.
Mulheres que foram infectadas no período anterior à gestação como regra geral não transmitem o parasita para o bebê.
Sífilis
A Sífilis congênita é uma condição evitável com diagnóstico e tratamento adequados da gestante durante o pré-natal, mas que continua sendo um importante problema de saúde pública.
Segundo o Ministério da Saúde, a taxa de incidência da sífilis congênita no Brasil é acima de 7 casos por 1.000 nascidos vivos. Esses números refletem falhas na triagem, tratamento ou seguimento adequado das gestantes, especialmente em população com acesso mais limitado aos serviços de saúde.
A transmissão ocorre de forma transplacentária, em qualquer fase da gestação, embora a doença seja mais grave quanto mais precoce for a transmissão.
O risco de transmissão vertical depende da fase da sífilis materna:
- Sífilis primária ou secundária: risco acima de 70%.
- Sífilis latente precoce: risco de 40-50%.
- Sífilis latente tardia ou terciária: risco de aproximadamente 10%.
- Também pode ocorrer transmissão intraparto, se houver lesões genitais ativas.
Testes de triagem para a sífilis são de rotina e obrigatórios no pré-natal, mesmo que a gestante não apresente sintomas. O teste para sífilis (VDRL ou teste rápido) deve ser feito nos seguintes momentos:
- Na 1ª consulta do pré-natal (idealmente até 12 semanas);
- No início do 3º trimestre (28 semanas);
- No momento do parto ou aborto.
A confirmação da Sífilis materna é feita com o VDRL positivo + teste treponêmico (ex: FTA-Abs, TPHA). No entanto, isso não significa que a doença tenha sido transmitida para o bebê.
A sífilis congênita pode ser suspeitada ainda durante a gestação, principalmente por meio da avaliação da mãe e da vigilância fetal. No entanto, o diagnóstico definitivo geralmente só é possível após o nascimento, com base em exames do recém-nascido.
Hepatite Congênita
A Hepatite congênita é uma inflamação hepática que acomete o feto ainda durante a gestação ou ao nascimento.
Ela pode ser causada por vírus hepatotrópicos, especialmente o vírus da Hepatite B (HBV) ou da Hepatite C (HCV). Mas pode também ser causada por outros vírus, incluindo o citomegalovírus (CMV), rubéola, sífilis, toxoplasmose ou herpes.
A hepatite congênita é relativamente rara, mas de alto impacto quando ocorre.
Nos países com alta cobertura vacinal e triagem pré-natal, a transmissão vertical por HBV e HCV tem diminuído.
Sem intervenção, o risco de transmissão vertical do HBV pode chegar a 90%, especialmente se a mãe for HBeAg positiva. A vacinação neonatal associada à imunoglobulina (HBIG) nas primeiras 12 horas de vida previne mais de 90% das infecções.
No caso do HCV, o risco de transmissão vertical é menor (5–10%), mas ainda relevante.
Embora não exista imunoprofilaxia eficaz, o conhecimento do status sorológico permite o acompanhamento adequado do RN e a planejamento de tratamento futuro.
Citomegalovirus Congênito
A infecção congênita por citomegalovírus (CMV) é uma das causas mais importantes de infecção intrauterina, podendo causar sérias sequelas neurológicas e auditivas no recém-nascido.
Essa é a infecção congênita mais comum no mundo, sendo que que 0,2 a 2,4% dos recém-nascidos são infectados congenitamente. Desses, apenas 10% são sintomáticos ao nascimento, mas até 15% dos assintomáticos podem desenvolver sequelas (principalmente surdez) observadas ao longo da infância.
Atualmente, não existe vacina contra o citomegalovírus. A prevenção depende de cuidados comportamentais, especialmente em gestantes:
- Lavar as mãos com frequência, principalmente após contato com secreções de crianças pequenas (saliva, urina).
- Evitar compartilhar talheres, copos ou escovas de dente com crianças pequenas.
- Cuidado em creches ou ambientes com alto risco de exposição.
Rubéola Congênita
A rubéola congênita é uma infecção viral adquirida da mãe durante a gestação.
Inicialmente, o vírus da rubéola invada o trato respiratório superior, disseminando-se através do sangue para diferentes partes do corpo, inclusive a placenta. A partir da placenta, o feto pode ser acometido.
A infecção materna por rubéola, particularmente durante o 1º trimestre, pode causar restrição do crescimento intrauterino e graves anormalidades do desenvolvimento. No entanto, esta infecção se tornou incomum no Brasil e boa parte do mundo com melhores indicadores de saúde, devido aos programas de vacinação.
A sorologia da IgG para rubéola deve ser feita rotineiramente no início da gestação. Ela deve ser repetida nos casos de gestantes soronegativas que apresentam sinais ou sintomas dque possam ser relacionadas à rubéola.
O diagnóstico é feito por um teste sorológico positivo para anticorpos IgM, quando o IgG inicialmente negativo se torna positivo (o que se chama de soroconversão) ou a partir de uma elevação de ao menos quatro vezes nos títulos de IgG.
Ao nascimento, os títulos de anticorpos devem ser medidos no bebê com suspeita da síndrome de rubéola congênita. A persistência da IgG específica para rubéola após 6 a 12 meses sugere infecção congênita. A detecção de anticorpos IgM específicos contra a rubéola geralmente também pode indicar infecção por rubéola, No entanto, alguns bebês podem apresentar resultados de IgM falso-positivos.
A cultura do vírus pode ser feita com amostras da nasofaringe, da urina, do líquido cerebrospinal, do esfregaço de leucócitos e da conjuntiva de neonatos.