Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)
O que é a Esclerose Lateral Amiotrófica?
A esclerose lateral amiotrófica (ELA) é uma doença degenerativa progressiva do sistema nervoso central. Ela afeta as células nervosas do cérebro e da medula espinhal, causando perda do controle muscular.
A ELA faz com que os neurônios motores se deteriorem gradualmente e depois morram.
Os neurônios funcionam como “fios elétricos”, que enviam sinais para que os músculos se contraiam. No paciente com Esclerose Lateral Amiotrófica, o músculo deixa de receber estes sinais e, com isso, deixam de funcionar.
A Esclerose Lateral Amiotrófica é mais comum entre os 40 e os 60 anos de idade. Entre 90% e 95% dos casos acontecem de forma esporádica, sem uma causa clara. Os outros 5% a 10% têm orige, genética. e são por isso denominados de Esclerose Lateral Amiotrófica Familiar.
Nos casos familiares, o risco do filho de um paciente com ELA familiar desenvolver a doença é de 50%.
Fisiopatologia
A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é uma doença neurodegenerativa que afeta o corno anterior da medula, tronco cerebral e células de Betz do córtex motor. Assim, para compreender os sintomas da doença, é preciso antes que se entenda como funciona o controle dos movimentos.
O movimento se inicia a partir de um estímulo que parte do giro pré-frontal no cérebro. Esse estímulo segue e passa pelo neurônio motor superior e neurônio motor inferior até chegar aos músculos.
Lesões do Neurônio Motor Superior levam a uma perda das conexões com unidade motora, gerando atividade excessiva dos segmentos medulares. Ela é caracterizada por hipertonia muscular, hiperreflexia e ausência de fasciculações. São exemplos de doenças do primeiro neurônio motor o Acidente Vascular Cerebral e o Trauma Cranioencefálico.
Já na lesão no Neurônio Motor interior, há uma diminuição ou ausência de atividade dos segmentos medulares. Ela é caracterizada por hipotonia ou atonia muscular, hipotrofia, hiporreflexia e presença de fasciculações.
A ELA é uma doença neurodegenerativa que acomete tanto os neurônios motores superiores como os neurônios motores inferiores. No entanto, os sintomas de Neurônio Motor Inferior são geralmente os primeiros a serem notados.
Além dos neurônios motores da medula espinal, a ELA pode acometer o bulbo e o tronco cerebral, normalmente de forma progressiva.
- O acometimento bulbar provoca sintomas como disfagia (dificuldade para engolir), disfonia (perda da qualidade da voz), sialorréia (babação), atrofia do músculo da língua e fasciculações.
- O acometimento do tronco cerebral é o mais temido, por ser o centro respiratório, gerando sintomas respiratórios, como dispneia, fraqueza do diafragma e sonolência.
Sintomas
A Esclerose Lateral Amiotrófica se caracteriza por um quadro de fraqueza muscular, que piora com o tempo.
A fraqueza geralmente se inicia nas mãos, pés ou membros e depois se espalha para outras partes do corpo.
Muitas pessoas relacionam os músculos com os movimentos de pernas e braços. Entretanto, é preciso compreender que eles são também fundamentais para o controle da deglutição, da fala e da respiração, entre outras coisas. Estas funções também podem ser comprometidas pela ELA.
Geralmente não há dor nos estágios iniciais da doença, embora ela costume estar presente nos estágios mais avançados.
Como a ELA ataca apenas os neurônios motores, os sentidos da visão, toque, audição, paladar e olfato não são afetados. Na maioria das vezes, os músculos dos olhos e da bexiga geralmente não são afetados.
Problemas nos braços e pernas
Problemas nos membros associados à Esclerose Lateral Amiotrófica incluem:
- Fraqueza nos membros superiores e/ou inferiores;
- Dificuldade para caminhar;
- Quedas frequentes;
- Cãibras e espasmos musculares;
Problemas com a alimentação
A Ela pode comprometer a musculatura que controla a deglutição e tornar a alimentação mais difícil.
Esta dificuldade alimentar, por sua vez, pode provocar desnutrição e desidratação.
Há também um risco aumentado para engasgamentos, com alimentos e líquidos sendo levados aos pulmões. Assim, o risco para pneumonia também é maior.
Problemas com a fala
A maioria das pessoas com Esclerose Lateral Amiotróifica desenvolve problemas com a fala.
Inicialmente, o paciente apresenta uma fala arrastada, que pode se agravar com o tempo a ponto de dificultar a compreensão.
Nos estágios mais avançados, o paciente passa a depender de tecnologias específicas para se comunicar.
Problemas respiratórios
Com o tempo, a Esclerose Lateral Amiotrófica pode paralisar os músculos responsáveis pela respiração.
No início, o paciente pode se beneficiar de dispositivos para auxiliar com a respiração semelhantes àqueles usados por pacientes com apneia do sono, que fazem aumentar a pressão do ar inspirado. Estes aparelhos são usados especialmente no período noturno.
Com o tempo, pode ser necessário realizar uma traqueostomia. Neste procedimento,
Um respirador usado em tempo integral “empurra” e remove o ar para dentro e para fora dos pulmões através de um tubo artificial implantado na traqueia.
A insuficiência respiratória é a causa mais comum de morte em pacientes com Esclerose Lateral Amiotrófica.
Demência
Estima-se que aproximadamente 50% dos pacientes com ELA apresentem algum grau de comprometimento cognitivo e/ou comportamental, com até 20% dos pacientes com atingindo critérios diagnóstico para demência (1). Na maior parte destes casos, o paciente desenvolve um tipo de demência chamado de Demência Frontal temporal.
Estágios da Esclerose Lateral Amiotrófica
Estágio 1 (inicial)
Os primeiros sinais da ELA costumam ocorrer muito antes do aparecimento dos primeiros sintomas.
As manifestações iniciais geralmente acontecem de duas maneiras: início espinhal ou início bulbar.
O início espinhal é muito mais comum e envolve fraqueza nos membros. A pessoa pode sentir fadiga, ter falta de equilíbrio, ter uma pegada fraca ou tropeçar ao caminhar.
Já o início bulbar, que é muito menos comum, tem os primeiros sintomas relacionados à face ou pescoço e pode incluir dificuldade para falar, mastigar ou engolir, com queixas como fala arrastada, engasgos frequentes ou rouquidão.
Estágio 2 (intermediário)
No estágio intermediário, a atrofia muscular se espalha para outras partes do corpo, aumentando a fraqueza. Alguns músculos ficam paralisados e outros podem encurtar, gerando contraturas.
Caminhar se torna mais desafiador. Se a pessoa cair, pode não conseguir se levantar sozinha. Dirigir não é mais uma opção, e o indivíduo pode precisar de ajuda com as atividades da vida diária.
Engolir e mastigar também se torna cada vez mais difícil, com maior risco de engasgo. A respiração também fica mais lenta, provocando exaustão e deixando a voz mais fraca.
A perda progressiva da independência e a necessidade de maior assistência podem levar a sentimentos de frustração, tristeza e sensação de perda.
À medida em que os músculos do tronco também são comprometidos, a mobilidade, o equilíbrio, a estabilidade e a capacidade de manter uma postura ereta são impactadas.
Quando a deglutição fica seriamente comprometida, a gastrostomia pode se fazer necessária.
Estágio 3 (avançado)
Na ELA avançada, a maioria dos músculos voluntários fica paralisada, incluindo os da boca, da garganta e os respiratórios.
A mobilidade é extremamente limitada e a alimentação excepcionalmente difícil, de forma que o indivíduo precisará em algum momento de uma sonda de alimentação.
Estágios 4 (final)
A ELA é sempre fatal, e a maioria das mortes resulta de insuficiência respiratória. Medicamentos podem aliviar o desconforto, a ansiedade e o medo causados pela insuficiência respiratória.
A fala se tornou quase ininteligível ou impossível.
Os cuidados paliativos podem controlar a dor e outros sintomas, ao mesmo tempo que oferecem apoio emocional e espiritual à pessoa com ELA e à sua família. Eles ajudam a garantir que a pessoa tenha a experiência mais tranquila, digna e indolor possível.
A duração desta última fase pode variar de vários meses a alguns anos. Ela é influenciada por diversos fatores, incluindo a saúde respiratória, o bem-estar geral, o estado nutricional, o nível de cuidados médicos e paliativos recebidos e as decisões pessoais de tratamento tomadas pelo paciente e sua família.
Diagnóstico da Esclerose Lateral Amiotrófica
Não existe um exame específico capaz de confirmar ou descartar a Esclerose Lateral Amiotrófica, de forma que o diagnóstico se baseia no conjunto de informações da história clínica, exame físico e do exame de eletroneuromiografia.
A ressonância magnética é normal na doença, mas deve ser solicitada para descartar outras condições. Da mesma forma, exames laboratorias também são solicitados para se fazer o diagnóstico diferencial com outras condições.
Eletroneuromiografia
A eletroneuromiografia é o exame mais importante para o diagnóstico de Esclerose Lateral Amiotrófica. Ela identifica a perda dos neurônios motores e demonstra a presença de denervação ou sinais de reinervação que são os responsáveis pela fraqueza. O exame deve avaliar todos os segmentos do corpo, incluindo:
- Músculos da cabeça e pescoço (língua, músculos da mastigação e músculos cervicais)
- Músculos dos membros superiores
- Músculos dos membros inferiores
- Músculos abdominais ou dorso
A eletroneuromiografia possibilita ainda o diagnóstico diferencial com miopatias e outras causas de lesão nervosa potencialmente tratáveis.
Critérios diagnósticos
O diagnóstico precoce é difícil de ser fechado, uma vez que os sintomas são semelhantes aos de outras condições neurológicas (2). Por outro lado, esse é o melhor momento para se iniciar o tratamento.
Assim, o diagnóstico clínico da ELA deve ser considerado da seguinte forma:
- ELA clinicamente definitiva: evidências de disfunção dos neurônios motores superiores e inferiores em 3 regiões do corpo (bulbar, cervical, torácica ou lombossacral);
- ELA clinicamente provável: evidência clínica de disfunção de neurônios inferiores e de neurônios motores superiores em pelo menos 2 regiões. Além disso, deve haver disfunção de motores superiores em um nível mais alto do que os sinais de disfunção dos neurônios motores inferiores;
- ELA clinicamente provável com apoio laboratorial: sinais clínicos de disfunção de neurônios motores inferiores. Já os sinais de disfunção de neurônios motores superiores são encontrados em somente uma região do copo. Além disso, há evidência eletromiográfica de disfunção de neurônios.
- ELA Possível– Sinais de neurônios motores superior e inferior em uma região somente.
- ELA Suspeita- Sinais de neurônio motor inferior em uma ou mais regiões (bulbar, cervical, torácica ou lombossacral). Sinais de neurônio motor superior em uma ou mais regiões (bulbar, cervical, torácica ou lombossacral).
Vale considerar que cerca de 10 a 15% dos casos, os pacientes recebem o que chamamos de falso positivo. Isso significa que eles são informados de que têm ELA, mas, no final, outra doença ou condição é descoberta como o problema real. Considerando-se a baixa frequência da doença
Alguns sinais devem alertar para a possibilidade de outras condições:
- Problemas cognitivos outros além daqueles da Demência Frontotemporal;
- Presença de anomalidades esfincterianas (incontinência urinária ou fecal, obstipação ou retenção urinária)
- Problemas visuais
- Comprometimento sensitivo
- Disfunção autonômica: sudorese, palpitação cardíaca, ondas de calor)
Tratamento
Nenhum tratamento é capaz de curar a doença ou reverter os danos causados pela Esclerose Lateral Amiotrófica. Entretanto, é possível retardar a progressão dos sintomas, prevenir complicações e melhorar o conforto e a independência do paciente.
Além de medicamentos específicos, o tratamento pode envolver:
- Suporte ventilatório;
- Fisioterapia e Terapia Ocupacional;
- Fonoaudiologia;
- Suporte psicológico.
Tratamento medicamentoso
Os tratamentos medicamentoso na ELA podem ser divididos em duas grandes modalidades:
- Medicamentos sintomáticos: têm por objetivo o controle de sintomas decorrentes da ELA, como sialorréia (babação), falta de ar, tosse, insônia, fadiga, dor, constipação intestinal, anorexia/inapetência ou sintomas depressivos, entre outros.
- Medicamentos específicos: buscam retardar a progressão da doença.
Até o momento não há nenhum medicamento capaz de curar ou regredir os sintomas da ELA. Alguns medicamentos têm efeito modesto em retardar a evolução da doença.
O medicamento mais utilizado e mais conhecido para isso é o Riluzol. O riluzol bloqueia a liberação de glutamato e desta maneira previne que as células nervosas sejam lesadas.
O momento da introdução do medicamento é essencial para a evolução da doença. Quanto mais precoce, melhor a evolução, de forma que mesmo aqueles pacientes que têm a doença como suspeita devem fazer uso do medicamento para diminuir a velocidade do processo degenerativo nos neurônios motores.
A metilcobalamina vem sendo utilizada em alguns centros especializados com resultados satisfatórios em estudos preliminares, mas sem uma evidência mais robusta. Vale lembrar que o princípio ativo é distinto da cianocobalamina, frequentemente utilizada no tratamento da deficiência de vitamina B12.
O Edaravone é uma droga recentemente aprovada nos EUA para tratamento nas fases iniciais da doença, com efeitos modestos. Ela ainda não está disponível comercialmente no Brasil.
Prognóstico
A insuficiência respiratória é a causa mais comum de morte em pacientes com Esclerose Lateral Amiotrófica.
Em média, os pacientes passam os seguintes tempos em cada estágio da doença:
- Estágio inicial: 0 a 2 anos desde o diagnóstico
- Estágio intermediário: 2 a 4 anos desde o diagnóstico
- Estágio avançado: 4 a 6 anos desde o diagnóstico
- Estágio final: 5 anos após o diagnóstico
No entanto, esse ritmo de progressão varia de paciente para paciente. cerca 10% sobreviverão a mais de 10 anos e 5% viverão 20 anos ou mais.
Um caso de longevidade que sempre é lembrado é o de Stephen Hawkins, que viveu por mais de 50 anos com a doença.