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Princípios do Treinamento Resistido (treino de força)

 

O que é o Treinamento Resistido?

O treinamento resistido, também conhecido como treinamento de força, envolve qualquer atividade em que o corpo precise vencer uma resistência externa.

Essa resistência pode ser imposta por pesos livres (halteres, barras), equipamentos de musculação, faixas elásticas, bolas medicinais ou até mesmo pelo peso do próprio corpo.

Embora seja comumente associado ao ganho de força, o treinamento resistido pode ser estruturado para desenvolver outras valências físicas fundamentais, como:

  • Mobilidade articular
  • Estabilidade corporal
  • Potência muscular
  • Resistência muscular localizada

Para isso, é essencial aplicar o princípio da especificidade: cada uma dessas capacidades deve ser treinada por meio de métodos e estímulos próprios. Da mesma forma, o treino precisa considerar as demandas físicas de cada indivíduo, bem como seus objetivos, limitações e contexto funcional.

  • Um bailarino, por exemplo, necessita de ampla mobilidade de quadril, algo menos exigido de um jogador de futebol.
  • Um levantador de peso olímpico precisa de potência, enquanto um bailarino prioriza o controle corporal fino e a estabilidade articular.
  • Já um idoso que busca manter ou melhorar sua capacidade funcional, deve ter o foco do treino voltado para as limitações encontradas na rotina — seja subir escadas, carregar sacolas ou evitar dores posturais.

Além disso, cada uma dessas habilidades deve ser treinada de forma sequencial e lógica:

  • Antes de se adicionar resistência (força) em um movimento, é preciso que o movimento em sí esteja sendo realizado com eficiência. Assim, treinos para ganho de mobilidade e estabilidade devem anteceder o treino de força.
  • Antes de realizar um movimento com velocidade, é preciso que o movimento em sí esteja adequado, de forma que mobilidade, estabilidade e força precisam ser obtidos antes de se treinar potência.
  • A repetição só deve ser treinada quando o movimento, feito de forma isolada, estiver adequado. Assim, mobilidade, estabilidade e força precisam ser treinados antes da resistência.

 

  1. Mobilidade

Mobilidade e flexibilidade são capacidades físicas distintas, mas complementares.

Mobilidade articular se refere à capacidade de uma articulação se mover de forma ativa, até a sua amplitude máxima.

Um exemplo simples: quando pedimos para alguém dobrar o joelho o máximo que conseguir, estamos avaliando sua mobilidade.

Já a flexibilidade se refere à amplitude passiva do movimento. Neste caso, é o avaliador quem realiza o movimento, estando a musculatura relaxada.

Mobilidade é mais importante do que a flexibilidade do ponto de vista funcional. No entanto, não há mobilidade eficiente sem uma boa flexibilidade.

Assim, tanto a flexibilidade como a mobilidade precisam ser treinadas.

Como Treinar Flexibilidade e Mobilidade

Para desenvolver flexibilidade:

  • Alongamentos passivos (mantidos por determinado tempo com o músculo relaxado);
  • Liberação miofascial, utilizando rolos, bolas ou técnicas manuais.

Para melhorar a mobilidade:

  • Exercícios que combinem força, controle motor e amplitude de movimento;
  • Movimentos que simulem padrões funcionais (como agachamentos profundos e rotações controladas do tronco);
  • Alongamentos dinâmicos e controlados, especialmente úteis no aquecimento no início da atividade física.
  1. Estabilidade

Estabilidade é a capacidade do corpo de controlar o movimento, mantendo o alinhamento adequado das articulações, mesmo diante de forças externas ou internas.

Quando fazemos um exercício de ponte, por exemplo, o corpo só não “despenca” com a força da gravidade por conta da musculatura estabilizadora, que busca manter as articulações estáticas.

A estabilidade articular é importante para garantir que as articulações adjacentes possam se mover de forma segura e eficiente.

Por conta disso, o corpo tem alterna articulações com função primária de mobilidade com articulações que têm função primária de estabilidade, conforme mostrado na tabela abaixo.

  1. Força

Força está relacionada à capacidade de vencer uma resistência externa e produzir movimento.

Ao subir uma escada, por exemplo, a musculatura do joelho precisa produzir força suficiente para levantar o peso do corpo de um degrau ao outro.

Na musculação, é preciso produzir força para vencer o peso dos aparelhos ou alteres

  1. Potência

Potência muscular está relacionada à capacidade de realizar um movimento de forma mais veloz.

Na prática esportiva, saques, arremessos e chutes são ações que dependem muito da velocidade de movimento, ou seja, da potência muscular.

No dia a dia, ela é importante também para atividades como levantar-se de uma cadeira, ou para recuperar o equilíbrio ao tropeçar em um objeto.

  1. Resistência

A resistência está relacionada à capacidade de realizar um movimento de força de forma repetitiva.

Esportes como a corrida e a natação dependem bastante da resistência muscular.

No dia a dia, ela é importante, por exemplo, para subir uma escada.

Exercícios concêntricos, excêntricos e isométricos

Todo movimento articular resulta da interação entre diferentes grupos musculares e de fatores externos, como a força da gravidade, o peso corporal ou cargas adicionais (como halteres, por exemplo).

Mesmo quando um músculo está sob contração, ele pode:

  • Encurtar-se
  • Alongar-se
  • Permanecer com o mesmo comprimento

Essas variações nos levam a três tipos principais de ação muscular durante os exercícios resistidos:

  1. Contração Concêntrica

Ocorre quando a força de contração do músculo vence a resistência externa, resultando no encurtamento do músculo.

Exemplo: Durante a fase de subida ao levantar um haltere no exercício de bíceps, o músculo está se contraindo de forma concêntrica.

  1. Contração Isométrica

Nesse tipo de contração, o músculo está ativamente contraído, mas não há alteração no seu comprimento. Ou seja, ele não se encurta nem se alonga. Assim, não há movimento na articulação.

Exemplos:

  • No exercício de prancha abdominal, os músculos do CORE estão em contração isométrica.
  • Quando seguramos um peso nos braços (como carregar um bebê), os músculos permanecem ativados sem movimento aparente (contração isométrica)
  1. Contração Excêntrica

Acontece quando o músculo resiste a uma força externa, mas se alonga durante o processo. Essa ação funciona como um freio natural do movimento.

Exemplos:

  • Ao descer lentamente um haltere no exercício de bíceps, o músculo está em contração excêntrica.
  • Ao descer uma ladeira, o quadríceps contrai-se de forma excêntrica para controlar (desacelerar) a velocidade do corpo.

Cada tipo de contração tem uma função específica no desenvolvimento da força, controle motor e prevenção de lesões. Assim, todos eles devem fazer parte de um programa de treinamento resistido bem estruturado

  • Contrações excêntricas: são essenciais para a prevenção de lesões musculares, já que a maioria das lesões ocorrem durante esse tipo de ação. Exercícios excêntricos ajudam a fortalecer os músculos sob tensão e a prepará-los para movimentos de desaceleração e impactos.
  • Contrações isométricas: importantes para o treinamento de estabilidade articular e controle motor. A musculatura da região lombar, por exemplo, atua principalmente de forma isométrica para permitir movimentos controlados dos membros. Exercícios como a prancha são fundamentais para desenvolver esse tipo de estabilidade.
  • Contrações concêntricas: são as mais utilizadas quando o objetivo é elevar cargas ou realizar movimentos dinâmicos. Elas desenvolvem a capacidade de gerar força ativa, essencial em praticamente todos os padrões de movimento.

Exercícios uniarticulares ou multiarticulares

Exercícios uniarticulares são aqueles nos quais apenas uma articulação está envolvida no movimento. Consequentemente, eles recrutam um número limitado de grupos musculares de forma simultânea.

Tradicionalmente, os treinos em academias eram bastante focados nesses exercícios. Como cada exercício trabalha um único grupo muscular, eram necessárias várias séries diferentes para oferecer um estímulo corporal completo. Isso tornava os treinos mais longos e com menor gasto energético total.

Nos últimos anos, os exercícios multiarticulares têm ganhado espaço. Nesses exercícios, várias articulações e grupos musculares são ativados simultaneamente. Um exemplo clássico é o agachamento, que envolve tornozelos, joelhos, quadris e coluna.

Graças à sua abrangência, os exercícios multiarticulares permitem um treino mais completo com menos séries, o que reduz o tempo total de sessão. Além disso, promovem um maior gasto energético, o que os torna atrativos tanto para quem busca condicionamento físico quanto para objetivos estéticos ou de performance.

Por todos esses benefícios, modalidades de treinamento baseadas em exercícios multiarticulares, como os treinos funcionais e o Levantamento de Peso Olímpico, vêm se tornando cada vez mais populares.

No entanto, isso não significa que os exercícios uniarticulares estejam ultrapassados. Eles continuam sendo relevantes e devem integrar um programa de treinamento resistido bem planejado. Os exercícios multiarticulares exigem maior coordenação motora, controle corporal e técnica. Por isso, para iniciantes, os exercícios uniarticulares podem ser uma opção mais segura e eficaz no processo de aprendizagem dos padrões de movimento.

Além disso, os exercícios uniarticulares são fundamentais para a correção de desequilíbrios musculoesqueléticos, que são comuns tanto em atletas de alto rendimento quanto em praticantes iniciantes de atividade física.

Exercícios uniarticulares X multiarticulares
Característica Uniarticulares Multiarticulares
Articulações envolvidas Uma Múltiplas
Grupos musculares ativados Poucos Vários
Gasto energético Baixo Alto
Complexidade técnica Baixa Alta
Indicação Iniciantes, reabilitação Treinamento funcional, esportes

Exercícios unilaterais ou bilaterais

Ao se realizar uma cadeira extensora ou flexora, por exemplo, os movimentos podem ser feitos com uma perna de cada vez ou com as duas pernas ao mesmo tempo. Se, por um lado, os exercícios com as duas pernas simultaneamente economizam tempo, por outro podem acentuar eventuais desequilíbrios musculares, uma vez que a tendência é de usar mais a perna forte e poupar a fraca.

Exercícios unilaterais são capazes de corrigirem estes desequilíbrios: Deve-se iniciar pelo lado mais fraco, contando quantas repetições conseguiu realizar com ele. No lado mais forte, executa-se o mesmo número de repetições, mesmo que possuindo força para mais.

Nos membros superiores, o uso de halteres, ao invés de barras, ajudará a corrigir eventuais desequilíbrios. Com os halteres, a força será dividida de forma proporcional entre os braços, exigindo mais do lado mais fraco. Já no caso dos exercícios com barras, o lado dominante pode atuar com mais força, compensando a deficiência do outro braço e acentuando ainda mais a deficiência.

Número de repetições

O número de repetições nos exercícios resistidos é um fator fundamental para alinhar o treinamento aos diferentes objetivos, como ganho de força, hipertrofia muscular ou resistência muscular.

De acordo com a faixa de repetições escolhida, o estímulo promovido pode favorecer mais um desses componentes físicos:

  • Baixo número de repetições com alta carga tende a desenvolver força máxima;
  • Repetições moderadas, com cargas intermediárias, são ideais para a hipertrofia (crescimento muscular);
  • Alto número de repetições, com carga leve, favorece a resistência muscular localizada.

A prática de exercícios resistidos é frequentemente associada a indivíduos com grande volume muscular. No entanto, essa percepção é equivocada. Nem sempre uma pessoa musculosa é, de fato, mais forte. Da mesma forma, é possível ganhar força sem grandes ganhos na massa muscular.

Nem todos os atletas têm como objetivo a hipertrofia. Em muitas modalidades esportivas, o ganho de massa muscular pode representar um fator negativo, principalmente quando está atrelado ao aumento de peso corporal. Isso pode impactar negativamente o desempenho em esportes como o atletismo, o vôlei ou o basquete, onde potência e agilidade são mais importantes do que volume muscular.

Em modalidades como ginástica rítmica ou balé, a hipertrofia é muitas vezes evitada também por razões estéticas.

Infelizmente, esse receio leva muitos atletas a evitar os exercícios resistidos, mesmo que o desenvolvimento de força muscular seja essencial para a performance e para a prevenção de lesões.

Carga e Repetições

A relação entre carga e número de repetições é determinante para os efeitos do treino. Exercícios com menor carga permitem um número maior de repetições, enquanto cargas elevadas só podem ser mantidas por poucas repetições.

No meio científico, é comum a utilização do conceito de 1 Repetição Máxima (1 RM) — ou seja, a maior carga que uma pessoa consegue movimentar em uma única repetição de um exercício.

Com base no valor de 1 RM, são estabelecidas faixas recomendadas para diferentes objetivos:

  • Força máxima: 85% a 100% de 1 RM
  • Hipertrofia muscular: 70% a 85% de 1 RM
  • Resistência muscular: 40% a 60% de 1 RM

Na prática, usa-se com frequência a distribuição por faixas de repetições:

Objetivo Número de repetições
Ganho de força 2 a 6 repetições
Hipertrofia muscular 8 a 12 repetições
Resistência muscular 16 ou mais repetições

Velocidade de execução (cadência)

A velocidade de execução, também conhecida como cadência, é um fator importante na musculação e que pode afetar os resultados dos treinos.

A velocidade é avaliada da seguinte forma:

  • Normal: quando leva 2 segundos na fase concêntrica e mais 2 segundos na fase excêntrica.
  • Média: quando dura 5 segundos na fase concêntrica e 3 segundos na fase excêntrica;
  • Baixa: quando leva 6 segundos na fase concêntrica e 4 segundos na fase excêntrica.

A velocidade de execução deve ser adaptada de acordo com o objetivo do treino:

  • Para o ganho de força, velocidades elevadas ou máximas são recomendadas na fase concêntrica (1);
  • Para hipertrofia, estudos mostram ganhos similares em velocidades maiores ou menores (1);
  • Para a potência muscular, é preciso usar uma velocidade rápida;
  • Para pessoas com lesões, dores ou risco cardiovascular, é mais adequado executar os exercícios de forma lenta.

Vale considerar aqui que, no caso de exercícios realizados até a exaustão, a velocidade muda ao longo de uma série.

à medida em que a musculatura fadiga, a velocidade de execução torna-se progressivamente mais lenta.

Treino de potência

Potência muscular se refere à capacidade de produzir força rapidamente.

Para desenvolver potência, a velocidade de execução precisa ser elevada. O peso também precisa ser elevado, mas também não podem ser excessivamente elevados, de forma que impeçam a maior velocidade de execução.

Em atletas, o desenvolvimento de potência está associada a uma maior velocidade de pico na corrida e saltos mais altos, o que é fundamental em muitas modalidades. No tênis, permite um saque mais rápido. A velocidade em movimentos de arremesso também é otimizada.

Nos idosos, foi demonstrado que a potência muscular está associada com a capacidade de realizar as atividades da vida diária como andar, levantar de uma cadeira, subir escadas, também está relacionada ao equilíbrio e a postura, podendo ser um preditor mais forte do risco de queda do que a força.

Ainda que tanto força como potência diminuam com o avanço da idade, a perda de potência tende a ser mais acelerada (1).

Exercícios para ganho de potência devem idealmente ser incluídos em um programa de treino resistido para idosos. No entanto, é preciso cautela em pacientes com problemas articulares, como a osteoartrose. Isso porque o risco de lesões e sobrecarga é maior.

Cadeia cinética aberta X fechada

Em alguns casos, dois exercícios para o mesmo grupo muscular podem gerar estímulos completamente diferentes.

Cadeia cinética aberta se refere a exercícios em que o pé fica livre para se mover. O movimento é isolado e geralmente não há descarga de peso na articulação. Um exemplo para isso seria a cadeira extensora.

Já a cadeia cinética fechada se refere a exercícios em que o pé fica fixo enquanto a parte proximal (coxas e braços) se movimenta.  Podemos incluir aqui os agachamentos, o Leg Press ou a flexão de braços.