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Como abordar o ciúme?

Como abordar o ciúme?

Abordar o ciúme dentro do relacionamento nem sempre é fácil. Até porque, sabemos que as crises de ciúme podem ser dolorosas tanto para quem fica enciumado, quanto para quem presencia a situação.

Porém, conversar sobre o assunto, buscar entender o que está acontecendo e investir em cuidados com a saúde mental é imprescindível para elevar a qualidade de vida e minimizar os impactos desse problema.

Ao longo deste texto, apresentamos algumas considerações importantes sobre o tema. Acompanhe e reflita conosco.

Ciúme normal e ciúme patológico

Antes de abordarmos algumas questões referentes à forma como é possível conversar sobre o ciúme do outro, vamos analisar uma breve diferenciação do que pode ser considerado como “ciúme normal” ou “ciúme patológico”.

Segundo Freud, o ciúme “normal” pode ser entendido como um verdadeiro luto, no qual o indivíduo enciumado sente medo de perder a pessoa amada. Esse medo causa sensações de insegurança que podem ou não ser demonstradas pelo indivíduo com ciúme. Há também o comportamento de enxergar o terceiro (que causa ciúmes dentro da relação) como um verdadeiro “rival”. Aqui, não há agressividade e a sensação de perda causa desconfortos, sem serem excessivos.

Já o ciúme patológico consiste em uma espécie de “delírio”, no qual o indivíduo enciumado pode ter a total crença de que algo está acontecendo e de que ele está sendo traído. Embora o outro possa dar justificativas e explicações, a pessoa enciumada pode demonstrar um comportamento mais resistente às conversas, apresentando uma postura um pouco mais agressiva e, em casos mais intensos, violenta. Inclusive, o ciúme patológico pode ser percebido em casos de relacionamento tóxico e, nessas situações, é importante buscar ajuda.

Vale ressaltar que mesmo quando o ciúme é “leve”, o ideal é que o parceiro não o provoque. Isso porque vemos pessoas dizendo que “ciúmes é bonitinho”, quando, na verdade, a pessoa que o sente está sofrendo. Logo, provocar a sensação de ciúme no outro, apenas para vê-lo nesse estado, em casos de ciúme “normal”, é algo sádico e uma verdadeira falta de respeito. Portanto, esse tipo de comportamento deve ser evitado.

Como abordar o ciúme?

Esclarecido alguns pontos iniciais, vamos agora discutir um pouco mais sobre o como é possível trazer o assunto “ciúme” para dentro da relação.

Afinal, apenas se queixar pode não ser o caminho, e o ideal é construir uma atmosfera mais sadia para que a temática seja discutida entre o casal e algumas possibilidades sejam pensadas em conjunto, respeitando cada um.

Abaixo apontamos algumas considerações:

1. Comunicação assertiva e alinhamento de expectativas
A comunicação no relacionamento é a porta de entrada para discussões saudáveis que podem contribuir para a construção de uma relação saudável. Por meio da conversa franca, paciente e sincera, torna-se viável colocar em palavras as angústias, dúvidas e desejos.
Sendo assim, é importante que o casal se comunique de forma sincera, apresentando os fatores envolvidos com o ciúme.
Por exemplo, se você sofre com os comportamentos enciumados do parceiro, talvez este seja um momento para conversar com ele sobre isso. Falar que esse comportamento causa incômodos e solicitar uma reflexão que busque melhorias para ambos os lados pode ser bem relevante.
Lembre-se de também permitir que o outro fale sobre o assunto. Inclusive, considere usar este momento para que o casal alinhe as expectativas.
Isso porque, em alguns casos, a relação ainda nem evoluiu para algo sério e um dos dois já apresenta ciúmes dentro do relacionamento inicial. Logo, esclarecer quais são os limites do relacionamento e alinhar expectativas é muito importante. Afinal, se você não deseja dar continuidade ao relacionamento, no sentido de fazê-lo evoluir, será que é saudável continuar com esse tipo de relação sem avisar ao outro do seu ponto de vista? Pois é possível que o outro esteja desejando um relacionamento sério, e mantê-lo ciente das expectativas da relação é algo justo e saudável.

2. Traga a discussão que ciúme não é prova de amor
Outro ponto que deve ser levantado nas conversas que acontecem entre o casal, é com relação ao fato de que ciúme não é prova de amor. O ciúme, especialmente quando excessivo, apresenta, antes de qualquer coisa, um sinal de insegurança e, também, de falta de confiança.
Sendo assim, como é possível haver um amor por trás de um comportamento que demonstra desconfiança? Parece algo um pouco contraditório.
Obviamente, não estamos dizendo que uma pessoa que tem ciúmes não sabe amar, não é isso. O que queremos dizer é que o ciúme não necessariamente é uma prova de amor – e que pode ser a prova da ausência dele em alguns casos.
Desmistificar isso pode fazer com que a pessoa enciumada reflita, pois, às vezes, ela demonstra o ciúme em determinado grau para tentar “provar que ama”, quando, na verdade, outros gestos poderiam ser utilizados como forma de demonstrar que ama e que se importa com o parceiro.

3. Fique atento aos sinais de relacionamento tóxico
Atentar-se aos sinais de um relacionamento tóxico também é importante. Isso porque, às vezes, os comportamentos enciumados podem começar a aparecer de forma branda, evoluindo para atitudes manipuladoras e que visam o controle do outro.
Por se tratar de um crescimento gradativo, a outra pessoa pode não se dar conta de que está diante de um relacionamento abusivo. Por isso, aconselhamos que você leia o nosso artigo completo sobre relacionamento tóxico para analisar a situação com um olhar mais crítico e saber quais caminhos podem ser seguidos diante de um caso de relação abusiva.

4. Criem um “contrato conjugal” respeitoso
Entendemos como “contrato conjugal” os combinados e acordos que são feitos dentro de um relacionamento amoroso.
Por exemplo, se o casal decide que flertar na rua não é um problema, ou seja, não é considerado traição, isso faz parte desse “contrato” que é feito entre os dois. Em contrapartida, se ambos conversam sobre o assunto e decidem que esse tipo de comportamento é negativo, então ele não deverá acontecer enquanto existir um relacionamento.
Esse contrato pode ajudar a pessoa enciumada a expor as situações nas quais ela sente ciúme e, caso faça sentido, a outra parte poderá acatar com um acordo que impeça que a pessoa com ciúmes se sinta dessa forma.
Porém, é importante fazer esse contrato com cuidado, com respeito e com uma conversa franca. Isto é, não é porque o outro pediu para você não sair mais de casa que isso deverá ser acatado por fazer parte de um combinado do casal, não é mesmo?
É necessário ter bom senso e zelar pelo respeito, pela liberdade, pela saúde mental e pelo bem-estar dos envolvidos.
Vale ressaltar que esse contrato não é feito no sentido literal, de haver cláusulas e assinaturas. Mas sim, trata-se de um contrato firmado pela via verbal, por meio de uma conversa na qual é possível esclarecer os pontos de vista de cada um e criar acordos que respeitem ambos os envolvidos.

5. Cuidado com as mentiras
Se o casal entra em acordo sobre determinada situação, ambos irão acatar com isso, certo? Porém, se um dos dois “quebra as regras” do casal, a ponto de mentir para esconder que quebrou, é preciso ficar atento.
Dito de outro modo, se você realmente quer abordar o ciúme dentro do relacionamento e proporcionar mais segurança emocional para ambos os lados, a mentira não pode não ser o melhor caminho.
Afinal, o ciúme pode causar desconfiança, e a falta da verdade pode piorar a situação. Sendo assim, fique muito atento a isso, e ofereça uma relação que se baseia, primordialmente, na sinceridade e honestidade.
Além disso, reflita consigo mesmo: se é necessário mentir sobre o que é feito, será que realmente essa relação pode apresentar subsídios para um bom desenvolvimento no futuro? Será que a mentira não é um sinal de que algo está descompassado e que exige manutenção de ambas as partes?
Essas são algumas reflexões que podem contribuir neste caso.

6. Incentive a psicoterapia e/ou terapia de casal
Em alguns casos, o ciúme pode ser tão intenso que a saúde mental do casal e do indivíduo começam a ficar abaladas. Nessas situações, incentivar a busca de ajuda psicológica pode ser um caminho muito promissor.
Inclusive, a terapia de casal também poderá ser cogitada como uma possibilidade para encontrar novos caminhos para os dois.
Por meio da terapia, tanto individual quanto de casal, é possível praticar o autoconhecimento, entender os próprios limites, construir uma rotina mais saudável e respeitosa, conversar sobre o que se sente, criar um acordo conjugal mais respeitoso, e assim por diante.
Considerar essa possibilidade e, ainda, incentivar o outro a considerar isso, mostrando os benefícios da terapia e ajudando-o a compreender as possibilidades por trás dela, é algo que pode ser utilizado na hora de abordar o ciúme dentro da relação.

7. Escuta ativa, empatia e acolhimento dentro da relação
Uma pessoa enciumada pode não escolher sentir a sensação que percorre a sua mente e o seu corpo. Inclusive, uma pessoa enciumada pode estar sofrendo por conta do medo de perder o outro.
Por isso, quando se trata de relacionamentos saudáveis (e não abusivos), aprender a escutar e a acolher pode ser uma via interessante. Lembre-se de que o outro pode estar começando a aprender a lidar com essas sensações, e se você opta por permanecer ao lado dessa pessoa, será que não vale a pena colocar-se no lugar dela e tentar entender o que acontece?
Além disso, escutar as emoções do outro, ajudando-o a expor o que sente e por que sente, podem ser medidas promissoras dentro de um relacionamento.
Claro que você não precisa ser um “professor” ou “psicólogo” para o outro, mas em se tratando das relações sociais e, neste caso, amorosas, a escuta ativa e a empatia podem mudar muita coisa. Considere essas possibilidades.

Por que a pessoa que está comigo é tão ciumenta?

Além de analisar potenciais fatores na hora de abordar o ciúme, como elencamos anteriormente, talvez seja interessante pensar em situações que ajudem a entender por que o outro pode ter o sentimento de ciúme.

Embora não seja possível “diagnosticar” uma única causa para a pessoa, ainda mais se baseando em um texto na internet, existem pontos de reflexão que podem nos ajudar a entender melhor o outro.

Porém, lembre-se de que cada pessoa é única e que embora os fatores abaixo estejam presentes em alguns casos de ciúme, eles não são generalistas e universais, ok?

Esclarecido isso, vamos agora às possíveis causas, em alguns casos, das crises de ciúme:

1. Baixa autoestima
A baixa autoestima pode ser uma das causas do ciúme dentro do relacionamento. Isso porque a pessoa pode se sentir inferior com relação aos indivíduos que convivem com o parceiro.
Isto é, a pessoa pode acreditar que os colegas de trabalho do parceiro, por exemplo, são mais bonitos, inteligentes ou atraentes do que ela.
Além disso, a comparação excessiva, que é muito comum em casos de baixa autoestima, pode resultar em uma sensação de que o outro está prestes a trair, a todo momento, pois há “pessoas melhores” para ele.
A baixa autoestima também se relaciona com essa sensação de insegurança, de não conseguir bancar a relação e de não ser a pessoa ideal para o outro.
Por isso, se você perceber traços de baixa autoestima no parceiro ou na parceira, considere conversar sobre isso e incentive a busca da psicoterapia.
Além disso, trabalhar a autoestima no casamento e nos relacionamentos também é relevante.

2. Traumas da infância
Muitas pessoas têm uma história de vida difícil. Em alguns casos, há situações nas quais o indivíduo pode ter vivido fortes traumas na infância, como abandono, abuso, negligência, etc.
Essas situações podem acarretar problemas na autoestima e na saúde mental de forma geral. A pessoa pode crescer desconfiada, com complexo de inferioridade, com medo do abandono ser vivido na vida adulta, e assim por diante.
Por isso, essa também pode ser uma das potenciais causas do ciúme dentro do relacionamento.

3. Relacionamentos conturbados
Se a pessoa viveu relacionamentos conturbados antes de conhecer você, esse comportamento enciumado pode ser um reflexo disso.
Por exemplo, se a pessoa vivia um relacionamento sério e estava prestes a casar, mas descobriu uma traição, a decepção amorosa pode ter sido muito dolorosa. Dolorosa, inclusive, a ponto de provocar traumas e desconfianças que são carregados para outros relacionamentos.
Consequentemente, a insegurança na relação pode ser resultado de relacionamentos que não deram certo e que geraram angústia e sofrimento. Assim, o ciúme pode ser uma forma de se proteger de que algo dê errado, e ocorra o que aconteceu nos relacionamentos passados.

4. Normalização do ciúme vivida em outras circunstâncias
Se o indivíduo cresceu em um lar onde os comportamentos enciumados eram considerados normais e faziam parte da dinâmica da família, pode ser que isso faça com que o sujeito acredite que cada relacionamento amoroso precisa contar com o ciúme.
Isto é, a pessoa pode ter uma visão romantizada do ciúme, ou seja, ela pode acreditar que isso é uma prova de amor, quando na verdade, não é.
Aqui, cabe a sugestão que apontamos sobre desmistificar esse conceito, visando fazer a pessoa entender que o ciúme não é uma prova de amor.

5. Outras questões psicológicas
Por fim, não podemos deixar de considerar que outras questões psicológicas e psiquiátricas podem estar envolvidas com esse caso. Por exemplo, situações de delírio em casos psicóticos podem resultar em comportamentos enciumados, em desconfianças, e assim por diante.
Aqui, é muito importante buscar ajuda médica e psicológica para oferecer ao outro um suporte profissional adequado.
Afinal, para essas situações é possível encontrar tratamentos promissores, que visam minimizar os sintomas e aumentar a qualidade de vida do sujeito.
Assim, não é preciso enfrentar todo esse sofrimento sozinho. Existem profissionais preparados para lidar com essas questões. Lembre-se disso.

Referências
FARINHA, I. S. A natureza do ciúme. Dissertações de Mestrado – Mestrado em Psicologia, Aconselhamento e Psicoterapias. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10437/1292>. Acesso em 20 out. 2022.

FERREIRA-SANTOS, E. Ciúme: o medo da perda. Editora Claridade : São Paulo, 2011.

NICOLAU, A. C. R. Ciúme: uma reflexão sobre o normal e o patológico. Revista Eficaz.