Cirurgia de Transgenitalização Masculina
O que é a cirurgia de Transgenitalização Masculina?
A Cirurgia de Transgenitalização Masculina é um procedimento no qual as estruturas externas do Sistema Reprodutor Masculino são recriadas a partir das estruturas do Sistema Reprodutor Feminino em um homem transgênero.
Quando a cirurgia de Transgenitalização Masculina é indicada?
A decisão de realizar uma cirurgia masculinizante — bem como o tipo de procedimento a ser escolhido — é uma escolha profundamente pessoal. Ela deve considerar tanto os potenciais benefícios quanto os riscos e desafios associados a cada intervenção.
Do ponto de vista clínico e social, é importante afirmar:
é absolutamente possível viver como homem, ser reconhecido como tal e ter uma vida plena sem passar por uma cirurgia genital.
Muitos homens trans optam por não realizar a cirurgia de redesignação genital. As razões variam e são igualmente válidas:
- Questões de saúde;
- Medo dos efeitos colaterais;
- Fatores financeiros ou falta de acesso;
- Desejo de não se submeter a uma cirurgia de grande porte.
Nenhuma dessas razões invalida sua identidade — um homem trans é homem, com ou sem cirurgia.
Por outro lado, há homens trans que sentem incompletude física ou psicológica sem um pênis com características masculinas. Para essas pessoas, a cirurgia pode representar um passo importante em sua trajetória de afirmação de gênero e bem-estar.
Além das motivações pessoais, fatores sociais também costumam influenciar essa decisão.
Situações como o uso de vestiários masculinos, banheiros públicos com mictórios, atividades em piscinas ou mesmo a vivência da intimidade sexual podem gerar desconfortos ou inseguranças para quem não realizou a cirurgia.
Cada experiência é única, e o que faz sentido para uma pessoa pode não ser o mesmo para outra.
Dados sobre a escolha pela cirurgia genital em homens trans
Um estudo realizado nos Estados Unidos com 28 homens trans revelou que apenas 4 deles (14%) haviam passado por algum tipo de cirurgia genital (1). Os procedimentos incluíram:
- Duas histerectomias totais com salpingo-ooforectomias bilaterais;
- Um caso de implante peniano com alongamento uretral e estimulador clitoriano implantado;
- Um procedimento de tipo não especificado.
Esses dados mostram que a cirurgia genital não é uma escolha unânime, e que há diversas formas legítimas e válidas de vivenciar o gênero masculino.
Quais os critérios necessários para indicação da cirurgia?
De acordo com a World Professional Association for Transgender Health (WPATH), os seguintes critérios devem ser atendidos antes da realização de uma cirurgia de afirmação de gênero:
- Presença de disforia de gênero persistente e bem documentada, diagnosticada por profissional habilitado;
- Capacidade de tomar decisões informadas, demonstrando entendimento claro sobre os riscos, benefícios e implicações do tratamento;
- Idade mínima de 18 anos (requisito válido em muitos países, incluindo o Brasil);
- Estabilidade clínica em relação a eventuais condições médicas ou de saúde mental coexistentes;
- Cartas de recomendação de dois profissionais de saúde mental qualificados;
- Ter realizado ao menos 12 meses contínuos de terapia hormonal compatível com o gênero com o qual se identifica (no caso de cirurgias que envolvam características sexuais secundárias).
Importância da avaliação psicológica e psiquiátrica
A avaliação com psicólogos e psiquiatras especializados é um passo essencial no processo de preparação para a cirurgia. É importante reforçar que a inconformidade de gênero não é um transtorno mental. No entanto, ela pode estar associada a questões como ansiedade, depressão ou transtornos relacionados ao estresse, especialmente em contextos de discriminação ou rejeição social.
Essas condições, quando presentes, devem ser identificadas e tratadas com cuidado, garantindo o bem-estar emocional da pessoa trans antes e após a cirurgia.
Sobre o prazo de 12 meses de vivência na transição
O requisito de viver plenamente no gênero com o qual se identifica por pelo menos 12 meses antes da cirurgia foi estabelecido como uma medida de cautela. Embora reconhecidamente arbitrário, esse período busca reduzir riscos de arrependimento em relação a um procedimento irreversível.
Vale lembrar, no entanto, que cada pessoa tem seu próprio tempo: algumas podem se sentir prontas antes de 12 meses, enquanto outras podem precisar de mais tempo para amadurecer sua decisão.
Para homens trans que desejam realizar cirurgias como a faloplastia ou metoidioplastia, aguardar esse período também pode trazer benefícios anatômicos importantes. A ação prolongada da testosterona pode resultar em um aumento maior do falo, o que pode favorecer resultados cirúrgicos mais satisfatórios.
Retirada do útero e dos ovários
A retirada do útero e dos ovários, procedimento comumente realizado em homens trans, recebe o nome técnico de histerectomia com salpingo-ooforectomia bilateral.
Esse procedimento pode ser feito de forma isolada, independentemente de outras cirurgias genitais, e oferece diversos benefícios tanto físicos quanto psicológicos para quem opta por realizá-lo.
Por outro lado, é fundamental que a decisão de realizar ou não essa cirurgia seja individual e respeitada, considerando o momento, os desejos e a saúde de cada pessoa. Ter ou não ter útero e ovários não define a identidade de gênero de ninguém.
Principais razões para a realização da cirurgia:
- Redução do conflito hormonal: A presença dos ovários implica na produção natural de estrogênio, o que pode entrar em conflito com a terapia com testosterona. Ao remover os ovários, é possível reduzir a dose necessária de testosterona, diminuindo assim os riscos associados aos hormônios masculinizantes.
- Afirmação da identidade de gênero: A ausência de útero, trompas e ovários pode contribuir para que a pessoa se sinta mais alinhada com sua identidade de gênero, reduzindo sensações de desconforto ou disforia relacionadas a esses órgãos.
- Eliminação do risco de câncer ginecológico: A cirurgia elimina o risco de desenvolvimento de câncer de útero, ovário ou colo do útero, que ainda existiria mesmo com a suspensão da menstruação por meio da terapia hormonal.
- Fim da menstruação e sangramentos de escape: A histerectomia encerra definitivamente qualquer sangramento uterino, que pode ser motivo de grande desconforto para pessoas trans masculinas.
- Eliminação do risco de gravidez: Após a cirurgia, não há mais possibilidade de gestação, o que dispensa o uso de contraceptivos em relações com homens cis ou mulheres trans.
- Possibilita outras cirurgias futuras: A remoção desses órgãos também pode facilitar futuras cirurgias de afirmação de gênero, como a metoidioplastia ou faloplastia.
Técnica cirúrgica
Atualmente, a maioria das histerectomias realizadas para pessoas transmasculinas utiliza técnicas minimamente invasivas, como a videolaparoscopia ou a cirurgia robótica.
Esses métodos costumam oferecer menor tempo de internação, recuperação mais rápida e menos riscos de complicações pós-operatórias.
Fechamento / Remoção da Vagina
A remoção ou fechamento da vagina é geralmente realizada como parte do processo de faloplastia, uma das cirurgias de afirmação de gênero possíveis para homens trans.
Se houver interesse futuro em realizar a faloplastia, é recomendado que a vagina seja preservada até o momento da cirurgia. Isso ocorre porque o revestimento vaginal (mucosa) pode ser utilizado para a construção de uma uretra estendida — permitindo que a pessoa urine em pé, se assim desejar.
Embora nem todos os homens trans optem pela extensão uretral, essa possibilidade pode ser um fator importante na decisão cirúrgica, especialmente para aqueles que valorizam a experiência de urinar em pé como parte de sua expressão de gênero.
Vida sexual e prazer após a cirurgia
Outro ponto importante a considerar diz respeito à vivência da sexualidade após a remoção do útero e o possível fechamento da vagina.
Durante o orgasmo, é comum que os músculos do útero e da vagina se contraiam. Portanto, a remoção desses órgãos pode alterar essa sensação, o que varia de pessoa para pessoa.
No entanto, o clitóris — que é preservado durante o processo — continua sendo uma fonte importante de prazer. Com a administração de testosterona, é comum que o clitóris aumente de tamanho, o que pode intensificar a sensibilidade e a experiência do orgasmo para muitas pessoas.
Faloplastia
A faloplastia é um tipo de cirurgia de afirmação de gênero que tem como objetivo a criação de um neopênis a partir de tecido retirado de outras partes do corpo, como o antebraço, coxa ou dorso. Esse tecido é utilizado como enxerto para moldar uma genitália com formato, aparência e função semelhantes às de um pênis cisgênero.
Dependendo dos objetivos individuais, a faloplastia pode incluir:
- Alongamento da uretra, para permitir que a pessoa urine em pé;
- Criação de um pênis com capacidade de ereção, com ou sem implantes, possibilitando penetração sexual;
- Remodelação estética, com foco na aparência genital de acordo com os desejos da pessoa.
A cirurgia costuma ser realizada em múltiplas etapas — geralmente três ou mais, com intervalos de 3 a 6 meses entre os procedimentos. Ao final, costuma-se obter um pênis com tamanho médio compatível ao de um homem adulto.
Antes da cirurgia, a remoção permanente dos pelos na área doadora (como o antebraço) é essencial para evitar complicações e desconfortos. Esse processo pode ser feito por depilação a laser ou eletrocoagulação, e pode levar até 18 meses para ser concluído com segurança.
Por isso, é importante iniciar essa etapa com antecedência, sempre sob orientação de profissionais especializados.