Alcoolismo e Dependência Química na Terceira Idade
Alcoolismo e dependência química na terceira idade
Infelizmente, o alcoolismo e a dependência química na terceira idade ainda é um assunto pouco discutido no campo científico. Embora existam estudos sobre a temática, é possível perceber uma certa invisibilidade dos idosos frente a essa situação.
Por isso, neste texto nós reunimos informações importantes sobre essa temática, visando construir um espaço de acolhimento e conhecimento para idosos com dependência química e, também, para a própria família. Acompanhe e saiba mais.
Riscos do alcoolismo e da dependência química na terceira idade
O alcoolismo e a dependência química na terceira idade podem ser marcados por muitas causas, o que caracteriza-os como multifatoriais. Segundo estudos¹, o abandono vivido na terceira idade e as mudanças no ritmo de vida – como no caso da aposentadoria – são alguns dos potenciais gatilhos para a busca das drogas lícitas e ilícitas.
Muitas vezes, questões emocionais estão atreladas ao comportamento de consumir bebidas e drogas. O problema se torna ainda mais intenso quando pensamos que a população idosa pode representar um grupo de maior risco para o consumo de substâncias químicas, uma vez que é possível se deparar com problemas como:
1. Interferência no tratamento de doenças crônicas
Em muitas situações, o envelhecimento pode ocasionar uma maior vulnerabilidade para o organismo humano, de uma forma geral. Por isso, é muito comum nos depararmos com pessoas idosas que têm diagnóstico de doenças crônicas, como diabetes e hipertensão, por exemplo.
Sendo assim, um dos principais riscos do alcoolismo e da dependência química na terceira idade é justamente a interferência no tratamento dessas patologias. Afinal, as drogas podem alterar funções importantes do organismo do sujeito, resultando no agravamento do problema e na redução da eficácia dos tratamentos medicamentosos.
2. Desenvolvimento de novas patologias
Em casos nos quais o indivíduo é saudável, porém, possui a fragilidade da terceira idade – devido ao envelhecimento -, é possível que ele comece a desenvolver novas patologias em decorrência do alcoolismo e da dependência química.
É o caso de doenças como:
- Diabetes.
- Hipertensão.
- Doenças cardiovasculares.
- Problemas no fígado.
- Gastrite.
- Pancreatite.
- Entre outros.
Tudo isso pode impactar no bem-estar e na saúde mental do sujeito, que se verá diante de quadros que podem vir a ser graves e limitantes, no que diz respeito à autonomia e à capacidade funcional do idoso.
3. Interação de medicamentos com o consumo de álcool
O consumo de medicamentos pode aumentar na terceira idade, devido a uma série de fatores. Consequentemente, essa interação entre o álcool e os remédios pode ser bastante perigosa.
O efeito dos medicamentos pode ser cortado, bem como é possível que ocorra efeitos colaterais graves na saúde do indivíduo, inclusive, levando-o à morte.
4. Aumentam as chances de desenvolver transtornos mentais
O alcoolismo e a dependência química na terceira idade podem aumentar as chances de o indivíduo vir a desenvolver transtornos mentais. É o caso de quadros depressivos, ansiosos, problemas cognitivos relacionados à memória, concentração e foco, etc.
Sendo assim, o consumo exacerbado dessas substâncias pode resultar em efeitos catastróficos para a saúde mental e para a qualidade de vida do indivíduo como um todo.
5. Episódios de violência e acidentes
O consumo de bebida alcoólica também pode ser a mola propulsora de situações de violência e agressividade. O idoso pode demonstrar comportamentos explosivos, especialmente quando confrontado pela família. Situações de violência doméstica e maus tratos às crianças podem ocorrer nessas circunstâncias.
Além disso, os riscos de acidentes domésticos e de trânsito também se tornam uma realidade que merece atenção.
6. Comprometimento das relações interpessoais
O comprometimento das relações interpessoais é uma realidade em quaisquer casos de dependência química. Mesmo quando a família ainda se faz presente, o vínculo tende a ficar fragilizado devido às adversidades vividas por conta do vício.
Portanto, a qualidade de vida pode reduzir ainda mais, levando o idoso à solidão e ao isolamento social na terceira idade.
7. Acelera o envelhecimento do cérebro
Estudos² apontam que o consumo de álcool e substâncias que atuam diretamente no Sistema Nervoso Central podem acelerar o envelhecimento do cérebro, resultando em efeitos intensos na saúde cerebral e mental do indivíduo.
Tratamento para alcoolismo e dependência química na terceira idade
É importante que a família e o próprio dependente químico compreendam como funciona o tratamento para, então, buscar ajuda qualificada e que atenda às necessidades reais do indivíduo. Por isso, descrevemos a seguir alguns pontos envolvidos com a abordagem do paciente idoso dependente químico:
1. Internação e desintoxicação
Em casos graves, a internação (que pode ser compulsória, voluntária ou involuntária) pode acontecer. Durante a internação, o indivíduo passa pelo processo de desintoxicação, com acompanhamento médico.
2. Tratamento multidisciplinar
O tratamento costuma ser multidisciplinar, uma vez que a dependência química tem relação com fatores biológicos, fisiológicos, psicológicos, emocionais e sociais. Por isso, um conjunto de profissionais estará à frente do tratamento nesses casos.
3. Conscientização e orientações
A conscientização e a orientação do paciente também é uma parte importante do tratamento. Neste caso, tanto os médicos quanto o psicólogo poderão fazer questionamentos acerca do consumo, apontar as consequências do uso inadequado de substâncias químicas, entre outros fatores.
A ideia não é julgar ou culpabilizar o paciente, mas, sim, oferecer a ele novos pontos de vista sobre os próprios comportamentos, visando modificá-los de tal modo que a saúde e a qualidade de vida se tornem prioridades.
4. Psicoterapia
Durante o processo psicoterapêutico no caso de alcoolismo e dependência química na terceira idade, o psicólogo pode ajudar o indivíduo a percorrer o seu próprio caminho para o autoconhecimento.
São tratados os gatilhos por trás do comportamento compulsivo de consumir bebidas alcoólicas ou drogas; as emoções envolvidas com o antes, durante e depois do consumo; fatores de relacionamento interpessoal; impactos do consumo da substância química no dia a dia do idoso; entre outros fatores importantes.
A psicoterapia trata-se de um espaço de escuta, acolhimento, orientação e ressignificação, que é aberto para que o indivíduo possa se expressar, refletir e implementar mudanças sadias na própria vida.
5. Implementação de mudanças de hábitos
A implementação de mudanças de hábitos também faz parte do processo. Inclusive, durante a psicoeducação oferecida pelo psicólogo, esse tipo de mudança pode ser estimulada.
É o caso de analisar quais comportamentos têm sido nocivos para a saúde do sujeito, e como eles podem ser substituídos por outros.
Por exemplo, ao invés de comemorar algo positivo com bebida em um bar com amigos, este hábito pode ser trocado por uma viagem ou uma ida à praia com os mesmos amigos, sem a necessidade de consumir a bebida alcoólica.
Além disso, a implementação de hábitos saudáveis na rotina do sujeito, de uma forma geral, também é algo de grande relevância. Aqui, a equipe médica, juntamente do psicólogo, poderá orientar o paciente com relação à prática de exercícios, à qualidade de alimentação, etc.
6. Promoção de atividades coletivas
A promoção de atividades coletivas também é bem promissora na terceira idade. Isso porque a sociabilidade tem um papel muito importante no processo de manutenção da saúde mental do indivíduo idoso.
Além disso, essas atividades podem desencadear momentos de diversão, prazer e bem-estar, que aumentam a qualidade de vida do sujeito e, de quebra, oferecem benefícios para a saúde do corpo e da mente.
7. Orientação da família
A orientação dos familiares também é uma peça-chave na abordagem psicológica frente ao alcoolismo e à dependência química na terceira idade. A família costuma ser o amparo do indivíduo que está atravessando adversidades advindas do consumo de substâncias químicas.
Assim sendo, a orientação familiar tem como propósito oferecer recomendações e informações que possam auxiliar na abordagem que a família coloca em prática na hora de lidar com o indivíduo dependente.
Como a família pode lidar com o alcoolismo e a dependência química na terceira idade?
A família pode lidar com o alcoolismo e a dependência química na terceira idade de acordo com a realidade do indivíduo que está enfermo. Ou seja, não existe uma abordagem milagrosa capaz de minimizar os danos da dependência ou, simplesmente, extinguir o consumo da vida do sujeito.
No entanto, existem caminhos que podem, pouco a pouco, ser explorados, de acordo com as necessidades e contingências de cada situação.
Por isso, solicitamos que você considere os apontamentos abaixo como fatores de reflexão, e não como passos engessados que devem ser seguidos a qualquer custo. Dito isso, vamos às considerações:
1. Buscar compreender a dependência química
Um passo interessante e que pode fazer toda a diferença é o de buscar compreender, de fato, o que é e como ocorre a dependência química. Esse tipo de informação pode expandir a mente diante do que está acontecendo, oferecendo subsídios para que a família possa atuar frente à dependência de um modo mais assertivo.
Isso porque, infelizmente, muitas pessoas ainda não sabem que a dependência química é considerada uma doença. Ou seja, não se trata apenas de a pessoa querer ou não querer parar de consumir as drogas. É algo muito mais complexo que isso.
O indivíduo dependente precisa enfrentar uma série de desafios e efeitos fisiológicos que impactam a qualidade de vida na hora em que ele deseja parar de consumir drogas. Por isso o abandono das substâncias é algo tão difícil de ser atingido sozinho.
Sendo assim, o acompanhamento de profissionais da saúde faz toda a diferença no processo, e quando a família compreende esse ponto e incentiva a busca por ajuda, o indivíduo pode ter uma base mais sólida para enfrentar as adversidades nesse momento.
2. Não culpar o idoso
Nunca culpabilize o idoso pelo o que está acontecendo. Embora o consumo inicial da substância possa ter ocorrido por livre e espontânea vontade dele, o desenvolvimento do alcoolismo e da dependência química na terceira idade não se reduz apenas a um “querer ou não querer” consumir drogas.
A pessoa pode ter vivido questões emocionais intensas, pode ter sido pressionada pelo meio no qual estava inserida, ou pode ter tido curiosidade, devido a muitos fatores emocionais, contextuais, ambientais e fisiológicos.
Portanto, reduzir a problemática a um “culpado” é algo inadmissível.
A família pode ser o espaço de acolhimento, escuta e apoio diante do diagnóstico, e não um espaço que fortalece a culpa que o sujeito possivelmente já sente diante da situação, pois isso pode agravar os problemas de saúde mental.
Inclusive, quando o próprio idoso começar a se culpabilizar, é interessante que a família o ajude a enxergar por outras vias, uma vez que o consumo de drogas não é uma escolha oito ou oitenta, são muitos fatores envolvidos, além disso, a família pode dizer que ele possui uma doença que deve ser tratada por profissionais qualificados.
3. Promover e incentivar a busca por tratamento
Promover e incentivar a busca por tratamento também é uma postura que a família pode adotar na hora de lidar com alcoolismo e dependência química na terceira idade.
Demonstrar que o tratamento pode trazer benefícios, oferecer apoio diante das angústias e dúvidas do sujeito, bem como ajudá-lo a compreender as etapas do tratamento são algumas das medidas que podem ser interessantes nessas situações.
4. Produzir um ambiente de hábitos saudáveis
O lar pode ser a mola propulsora de mudanças positivas na vida do indivíduo. É o caso de a família oferecer um ambiente no qual hábitos saudáveis são estimulados.
Por exemplo, a família pode levar o idoso para passeios em conjunto, convidá-lo para caminhadas e atividades ao ar livre, incentivá-lo a se alimentar adequadamente – sendo um exemplo para ele -, entre outras medidas semelhantes.
Se a família se propuser a incluir hábitos saudáveis na rotina, e o idoso fizer parte disso, aos poucos, a qualidade de vida de ambos poderá ser estimulada com o passar do tempo.
5. Fortalecimento do vínculo
Sabemos que enfrentar o alcoolismo e a dependência química na terceira idade, dentro de casa, não é a coisa mais simples do mundo. Os desafios são intensos, e ter que encarar a situação não é nada fácil.
Muitas vezes, os vínculos familiares podem ficar fragilizados em decorrência do que está acontecendo. Porém, buscar meios, por mais remotos que sejam, de fortalecer o vínculo com o indivíduo dependente, é algo que pode fazer grandes diferenças mais tarde.
Não estamos dizendo que a família deve forçar a barra e ir atrás do idoso para construir e reconstruir os laços afetivos. No entanto, buscar se aproximar aos poucos, demonstrar preocupação, utilizar a comunicação não-violenta na hora de orientar e acolher, entre outras medidas, são ações pertinentes nesse caso.
Aos poucos, e com o auxílio de profissionais da saúde, o caminho poderá ser restaurado.
6. Cuidados com a saúde mental dos familiares
A família também sofre diante de um caso de alcoolismo e dependência química na terceira idade. Afinal, são mudanças na rotina, na visão de mundo, na saúde do idoso, na dinâmica familiar, enfim.
Consequentemente, a família também pode ficar abalada por conta de todas essas transformações.
Por isso, buscar apoio psicológico nessas situações é algo que pode ser bastante benéfico para os familiares.
Assim, é possível relatar as angústias, entender melhor as emoções, enfrentar os medos e as adversidades, encontrar forças internas, reconhecer novos caminhos que podem ser seguidos, ressignificar algumas crenças, etc.
Tudo isso, pouco a pouco, pode servir de base para tomadas de decisão mais sadias e efetivas com relação à própria atuação da família frente ao caso de dependência.
7. Evitar situações de gatilho
A família também pode ficar atenta aos potenciais gatilhos que têm apresentado para o idoso. É o caso de ter bebida alcoólica em casa, fazer eventos que contenham bebida e convidar o idoso, entre outras situações que possam aumentar a vulnerabilidade e as recaídas do indivíduo.
Obviamente, não estamos dizendo que a família deve abrir mão da sua vida em prol do sujeito dependente, mas, sim, ter cuidado com o que é feito diante da pessoa que está em uma situação vulnerável é algo válido que pode ser analisado.
Assim, quem sabe, torna-se possível criar uma atmosfera mais sadia e segura para o idoso que, diante de tantas dúvidas, tem atravessado muitos desafios no seu cotidiano.
Referências
1. SOARES DA SILVA, S. C.; OLIVEIRA, J. A. P. de. DEPENDÊNCIA DO ÁLCOOL NA TERCEIRA IDADE: Causas, consequências e desafios para a família e profissionais da área da psicologia. Psicologia e Saúde em debate, [S. l.], v. 4, n. 3, p. 46–59, 2018. DOI: 10.22289/2446-922X.V4N3A5. Disponível em: https://www.psicodebate.dpgpsifpm.com.br/index.php/periodico/article/view/V4N3A5. Acesso em: 9 nov. 2022.
2. LUCE, L. B. E. Alcoolismo na terceira idade – Revisão de literatura. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal de Minas Gerais. Brumadinho, 2012.