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Abordagem psicológica da dependência química na adolescência

Abordar a dependência química na adolescência, com linguagem apropriada e acolhimento, é uma forma de prevenir o consumo e oferecer um suporte mais saudável aos jovens.
No entanto, sabemos que essa temática pode ser bastante sensível para muitos pais e educadores. Pensando nisso, desenvolvemos este guia com considerações que podem ser úteis. Acompanhe.

O que leva um adolescente a consumir drogas?

Antes de pensarmos em como abordar a dependência química na adolescência, podemos analisar os motivos pelos quais os jovens podem consumir os entorpecentes. Obviamente, não estamos aqui para dizer que um jovem só consome drogas por conta dos aspectos abaixo, mas sim, estamos aqui para alertar algumas particularidades da adolescência que podem ter relação direta com esse consumo.

Assim, torna-se mais fácil analisar o contexto do adolescente e, quem sabe, oferecer a ele um apoio mais qualificado para prevenir o comportamento de consumo.
Vamos a esses fatores:

1. Contexto social e pressão de amigos
O adolescente está, pouco a pouco, descobrindo o mundo. A visão infantil que ele tinha sobre as relações abre espaço, agora, para a identificação com os amigos, a necessidade de se relacionar com quem pensa semelhante a ele, e assim por diante.
Dessa maneira, o jovem pode acabar se sujeitando a situações nas quais a pressão dos amigos vence a concepção que ele mesmo tem. Isto é, quando os amigos o pressionam para que consuma um entorpecente, ele pode se sentir instigado em ceder a isso. Caso contrário, poderá “sofrer” com a ausência dos amigos ou com a diminuição da autoestima ao ser chamado de “fraco”, por exemplo.
Portanto, o contexto social e a pressão de terceiros para que o consumo aconteça é um dos pontos relacionados com o uso de drogas por adolescentes.

2. Desejo de fazer parte de um grupo
Às vezes, o grupo social que o adolescente deseja fazer parte é aquele que consome entorpecentes de forma recorrente ou não, o que resulta em uma exposição às situações de risco.
Como o adolescente está descobrindo a própria identidade e encontrando-se em suas relações, ele sai em busca de um grupo social que o represente e que tenha traços semelhantes ao dele. Porém, muitas vezes esse grupo social pode ter comportamentos de risco, como a busca por entorpecentes.
Aqui, o adolescente pode consumir não apenas por pressão de terceiros, mas também como forma de simplesmente mostrar que faz parte daquele grupo. Isto é, ele consome o entorpecente para se sentir ainda mais “pertencente” àquilo.

3. Desejo de prazer e sensações novas
Durante a adolescência, muitas mudanças ocorrem no cérebro do jovem. Ele deixa de sentir aquele prazer pleno com atividades infantis, como brincar, ir à casa da avó, e assim por diante. Os neurotransmissores responsáveis pela sensação de prazer são diminuídos nesta fase da vida, o que resulta em momentos de tédio, desinteresse, etc.
Logo, para fugir dessa sensação negativa e buscar novas maneiras de sentir prazer, bem-estar e adrenalina, o jovem pode ir atrás de situações proibidas, como ocorre no consumo de entorpecentes.
Por isso, esse desejo por prazer e sensações novas também é uma das potenciais causas do consumo de drogas.

4. Busca por uma posição mais “autônoma”
A adolescência é uma “ponte” para a vida adulta. Aos poucos, o jovem vai deixando a sua visão infantil do mundo de lado, assim como deixa a sua dependência dos pais. À medida que o tempo passa, ele busca novas formas de fortalecer a sua autonomia e independência.
Porém, muitas vezes os jovens podem encontrar no uso de entorpecentes um “passaporte” para uma vida “autônoma”. É como se eles se sentissem mais adultos e maduros por conta do consumo da droga/de algo proibido.
No entanto, essa visão é deturpada. Afinal, a droga não os torna, de fato, independentes, e pode resultar em danos para a saúde física e mental.
Ainda assim, os pais precisam conhecer esse lado “autônomo” que o filho busca, para oferecer a ele a possibilidade de ter mais responsabilidades na vida sem despertar o interesse pelo uso de drogas.

5. Influência familiar
Sem dúvidas, o ambiente familiar também pode servir de estopim para o consumo de drogas. Se os pais consomem entorpecentes na frente do adolescente e, ainda, demonstram esse consumo como algo positivo e recreativo, o jovem, que está em busca de diversão e prazeres, pode se sentir instigado a experimentar.
Portanto, o contexto familiar precisa ser estruturado e evitar esse tipo de postura na frente do adolescente, a fim de preservar a saúde física e mental deste.

Como abordar a dependência química na adolescência?

Como vimos, existem muitos aspectos que podem estar envolvidos com o consumo de drogas na adolescência. Sendo assim, conhecer esses pontos é relevante na hora de abordar a dependência química na adolescência.
Afinal, dessa forma os pais poderão compreender, com mais coesão, as atitudes e decisões dos filhos frente ao consumo de drogas.
E, a partir disso tudo, torna-se viável construir um ambiente de diálogo e orientação que seja mais positivo.
Abaixo trouxemos algumas recomendações que partem dos aspectos citados anteriormente:

1. Exponha a real gravidade da situação
Muitas vezes, os adultos têm o costume de apenas “proibir” determinados comportamentos das crianças e dos adolescentes. É claro que limites precisam ser estabelecidos, mas proibições sem justificativas e embasamento são, apenas… Proibições. E isso quer dizer que não necessariamente o adolescente irá acatar com elas.
Portanto, exponha a real gravidade da situação aos seus filhos. Às vezes, as sensações vividas durante o consumo de um entorpecente são bastante prazerosas, o que instiga o desejo de consumir mais. Mas, o adolescente pode não estar ciente de todas as sensações ruins que irá sentir ao embarcar nessa história.
Sendo assim, aponte as consequências para a saúde física e mental; alerte sobre o quanto isso poderá ficar enraizado na vida do jovem por anos a fio; comente sobre os impactos na vida adulta, nos relacionamentos, no trabalho e nos estudos; deixe claro o quanto isso pode comprometer a estrutura familiar; fale sobre os problemas emocionais, os transtornos mentais e as doenças físicas; comente, ainda, sobre a dolorosa vida vivida por quem tem dependência química.
Contudo, não estamos dizendo para você criar um “filme de terror” para o seu filho. Mas ser realista é importante. Pois acredite, os jovens podem estar focados no aqui e agora, sem se dar conta das consequências de seus atos, e é papel dos pais alertá-los quanto a isso.

2. Ouça e acolha as dúvidas e os pensamentos do seu filho
Seu filho é um ser humano em formação. Ele não está pronto, e tampouco tem o discernimento que você possui nos dias atuais.
Desse modo, é muito importante que os adultos, tidos como “experientes”, ouçam as dúvidas e os apontamentos trazidos pelo filho.
Antes de reprimi-lo ou recriminá-lo, coloque-se no lugar dele. Use a comunicação não-violenta para apresentar o seu ponto de vista, visando a proteção da saúde do jovem.
Os adolescentes precisam sentir que podem contar com os pais e que não serão punidos se tiverem desejos e dúvidas. Permita-o conversar sobre o que pensam, mostre dados concretos para ajudá-lo a compreender a gravidade do consumo de drogas e comece a abordar a dependência química na adolescência com mais efetividade.

3. Mantenha um relacionamento próximo e com diálogo aberto
Seguindo o que apontamos logo acima, é muito importante que a família crie um relacionamento próximo com o adolescente.
E não estamos falando de “sufocar” o filho estando 24 horas por dia querendo saber o que ele está fazendo. Mas sim, estamos falando de se manter próximo, de escutar, de questionar, de contar algo ao seu filho.
Quando foi a última vez que você contou algo do seu dia para ele? Ou perguntou sobre o dia na escola? Ou contou sobre algo familiar? Pense sobre isso.
O diálogo pode acontecer em diversos momentos: na hora de assistir TV juntos, em um evento em família, nas refeições, etc. Manter essa proximidade pode fazer a diferença, já que se torna possível abordar a dependência química na adolescência com mais carinho e com base em uma relação sólida e de confiança.
Afinal, se os pais forem ausentes e tentarem, de um segundo ao outro, impor as suas vontades com relação ao consumo de drogas, os adolescentes podem se sentir “aprisionados” e injustiçados, tendo comportamentos contrários aos esperados pelos pais. Fique atento a isso.
Inclusive, a ausência dos pais pode servir de estopim para o consumo, já que o adolescente pode se sentir em sofrimento psíquico, buscando nas drogas um alívio e nos amigos um suporte afetivo que não há em casa.

4. Incentive atividade novas e saudáveis
Como vimos no decorrer deste texto, a adolescência pode ser marcada por um profundo sentimento de tédio, devido às mudanças cerebrais. Assim sendo, as drogas podem se tornar ainda mais atraentes e interessantes por conta disso.
Desse modo, os pais podem intervir e abordar a dependência química na adolescência investindo em novas atividades para o seu filho.
Que tal incentivá-lo a buscar um novo esporte? Ou a buscar um hobby diferente, instigante e que o mantenha ativo e feliz?
Esse tipo de abordagem pode ser muito relevante na hora de prevenir o consumo de drogas.

5. Auxilie na manutenção da autoestima do seu filho
Às vezes, problemas de autoaceitação e autoestima podem fomentar a busca por aceitação dos amigos, fazendo com que o adolescente acabe cedendo à pressão social.
Por isso, incentivar a autoestima do seu filho é uma forma de protegê-lo desse tipo de situação.
Se você comemora as conquistas do seu filho, deixa claro a ele os pontos fortes que possui, e aponta as qualidades que ele demonstra, você poderá incentivá-lo a desenvolver a autoestima.
Também instigue a prática de hábitos saudáveis, como exercícios, cuidados com a qualidade do sono, boa alimentação, autocuidado, etc. Tudo isso poderá ajudá-lo a ter uma visão mais positiva de si mesmo, o que o auxilia na hora de manter a sua posição frente ao consumo de drogas – negando às pressões, por exemplo.

6. Busque orientações com profissionais da saúde mental
Se você perceber que o seu filho tem apresentado comportamentos diferentes, e você está com dificuldades para abordar a dependência química na adolescência, converse com um profissional de saúde mental.
Um psicólogo poderá ajudá-lo a compreender melhor o seu filho, além de apontar algumas atitudes suas que poderão estreitar a relação e construir um ambiente mais seguro para o jovem.

7. Mantenha uma proximidade com a escola
Além de manter-se sempre próximo do seu filho, procure se fazer presente no ambiente escolar. Seja ativo, sugira intervenções, fale sobre a importância de saber abordar a dependência química na adolescência, entre outros fatores semelhantes.
Se os pais demonstrarem essa preocupação, o espaço escolar poderá se tornar ainda mais rico.
Portanto, participe das reuniões, opine, dê ideias e mostre o quanto essa abordagem temática é imprescindível.

8. Conheça as amizades do seu filho
Mantenha-se próximo das amizades do seu filho. Conhecer os amigos dele é uma forma de analisar como está sendo a construção dessas relações. Se você perceber comportamentos de risco por parte dos amigos, você poderá conversar com os pais destes, com a escola (caso sejam colegas de turma) e, claro, manter sempre uma orientação fundamentada para o seu filho.
Inclusive, fazer amizade com a família dos amigos do seu filho também é uma forma de analisar as situações de risco e resguardar o adolescente de locais onde o consumo de entorpecentes acontece.

9. Saiba mais sobre os ambientes que o seu filho frequenta
Além de pensar nas companhias, pense também nos ambientes que o seu filho frequenta. Isto é, embora o grupo social dele seja saudável e bem instruído pela família, ainda assim o adolescente pode se encontrar com pessoas mal intencionadas em determinados locais.
Sendo assim, sempre pesquise sobre os eventos que ele costuma frequentar, e mantenha um diálogo aberto sobre o que deve e o que não deve ser feito. Também alerte-o sobre os comportamentos de risco que outras pessoas podem apresentar.
Além disso, considere a possibilidade de sempre manter uma comunicação próxima com as famílias dos amigos. Assim, ambos podem criar uma rede de supervisão, monitoração e apoio aos jovens.
É o caso de um dos pais sempre se comprometer de buscar os adolescentes na festa, e outro de ir até o local, do lado de dentro, verificar o que ocorre por lá.
Tudo dentro de limites saudáveis para não “sufocar” os jovens ou invadir a privacidade deles, ok?

10. Inclua o adolescente nas responsabilidades da família
Como vimos no início deste conteúdo, os adolescentes estão passando por uma verdadeira e significativa transição em suas vidas. Estão saindo, aos poucos, daquela posição dependente e infantil que tinham até pouco tempo, e estão entrando em uma fase mais autônoma e independente.
Isso quer dizer que o jovem começa a buscar formas de mostrar que é mais “maduro” e adulto, e uma dessas formas, infelizmente, pode ser a busca por entorpecentes.
Sendo assim, uma alternativa preventiva, ao pensarmos em como abordar a dependência química na adolescência, é oferecer a ele mais responsabilidades.
Permita-o ajudar nas decisões da casa, instigue-o a começar em um trabalho adequado à sua idade, oriente-o a cuidar dos irmãos mais novos, peça-o para ficar responsável pela lista de compras do mercado de vez em quando, e assim por diante.
Essas pequenas responsabilidades o farão se sentir mais incluído e importante nas decisões “grandes” da família, o que diminui o comportamento de risco de buscar, nas drogas, uma prova de que é mais adulto.

11. Seja um exemplo
Se você cobrar do seu filho um comportamento completamente contrário ao seu, saiba que as chances de insucesso serão bem grandes.
Portanto, cuidado com o consumo de entorpecentes, mesmo eles sendo lícitos! Esse comportamento, quando ocorre de forma desenfreada na frente dos jovens, pode instigar a curiosidade e fazer com que a sua autoridade fique abalada.
Afinal, se você não consegue cumprir o que cobra, por que o adolescente se esforçará para cumprir? Pense sobre isso e reflita sobre a sua própria atuação.

12. Cuidado com os conteúdos consumidos pelo seu filho
Por fim, fique atento aos tipos de conteúdos que são consumidos pelo seu filho. Às vezes, as séries, filmes ou livros podem servir de estopim para uma curiosidade voltada ao consumo de entorpecentes.
Sendo assim, orientamos que você sempre verifique a Classificação Indicativa dos materiais, visando oferecer ao seu filho uma atmosfera mais segura e alinhada à faixa etária dele.

E lembre-se: em caso de dúvidas, converse com um profissional psicólogo voltado para a orientação de pais. Afinal, este conteúdo não exclui o acompanhamento de um especialista.

Referências
CANAVEZ, M. F.; ALVES, A. R.; CANAVEZ, L. S. Fatores Predisponentes Para O Uso Precoce De Drogas Por Adolescentes. Cadernos UniFOA, Volta Redonda, v. 5, n. 14, p. 57–63, 2017. DOI: 10.47385/cadunifoa.v5.n14.1021. Disponível em: https://revistas.unifoa.edu.br/cadernos/article/view/1021. Acesso em: 10 out. 2022.

CASTRO, M. S. Prevenção do uso de drogas: adolescência, família e escola. 2018.